Daniel Henriques: entrevista

Daniel Henriques: entrevista

Daniel Henriques é um dos convidados da Comic Con Portugal. Trabalha em full-time para o mercado norte-americano de comics, como arte-finalista. Iniciou o seu percurso profissional em 2011, ao integrar o estúdio do arte-finalista Danny Miki, com alguns títulos da Marvel. Desde 2013, tem trabalhado para diversas séries da DC Comics. Atualmente, encontra-se a realizar a arte-final da nova revista Justice League of America (vol.4), escrita e desenhada por Bryan Hitch.

Nuno Pereira de Sousa: Para quem não ouviu a emissão #36 do programa radiofónico Bandas, conta-nos como começaste a trabalhar profissionalmente com os comics norte-americanos.
Daniel Henriques: A minha iniciação deu-se já há uns anos, quando ainda tinha um trabalho regular, o que obrigava a que trabalhasse em comics após dias de 12 horas de trabalho. Mas a minha “descoberta” foi feita no facebook, onde um arte- finalista que sempre adorei, Danny Miki, viu alguns trabalhos meus  e contactou-me com o propósito de eu melhorar as minhas capacidades e entrar no estúdio que ele tinha na altura, CrimeLab Syndicate, dando-me a oportunidade de colaborar em séries como o Venom e o Incredible Hulk, entre outras.

NPS: Se tivesses de escolher apenas uma palavra para definir Danny Miki, qual escolherias?
DH: Detalhado.

NPS: Entretanto, começaste a trabalhar com o arte-finalista Jonathan Glapion. Que palavra o definiria?
DH: Orgânico.

NPS: Para além de realçar o trabalho do desenhador, que metas traças quando realizas a arte-final?
DH: O meu principal objectivo é mesmo trazer o melhor do desenhador e manter a sua identidade presente, mas conciliando-a com as minhas sensibilidades pessoais. Por outro lado, tenho sempre como objectivo geral facilitar a leitura da página, definindo os diferentes planos e texturas.

NPS: Que variantes existem na indústria norte-americana, quando falamos de arte-final?
DH: A nível de comics, há imensas variantes no processo criativo. Pode existir um desenhador a fazer layouts para depois outro desenhador finalizar. Pode existir só um arte-finalista que faça tudo. Ou esse arte-finalista pode, por vezes, ter um assistente que ajude nos cenários e a preencher os pretos… Há imensas possibilidades! Como os prazos são sempre relativamente apertados, o importante é conseguir fazer o melhor possível com qualquer uma das variantes possíveis!

NPS: Sendo a arte-final individualizada um passo quase mandatório na indústria de comics norte-americanos, embora não seja exclusivo da mesma, acreditas que venha a ser mais frequente noutras indústrias de BD?
DH: Geralmente, a arte-final está presente em tudo o que é BD. O que acontece muita vezes é ser o próprio desenhador a fazer a sua própria arte-final, mas isso depende muito dos prazos. Eu penso que a nível europeu não há muitos arte-finalistas porque, como são prazos mais alargados, o desenhador faz também essa tarefa. No mercado norte-americano, visto haver mais uma mentalidade de linha de produção, o mais frequentemente é haver sempre a divisão  das tarefas e, embora, por vezes, se salte essa etapa e a coloração seja feita diretamente nos lápis,  penso que o look mais desejado e habitual para o leitor é existir realmente arte-final na banda desenhada.

NPS: Na tua opinião, os leitores e as editoras dão o devido valor aos arte-finalistas?
DH: A nível editorial, penso que procuram sempre o melhor resultado para o livro. E, para isso que isso aconteça, significa que têm de conseguir o melhor de toda a equipa. A nível dos leitores penso que há um misto de pessoas, as que sabem o que é um arte-finalista e apreciam o seu contributo para a revista e as pessoas que não fazem a mínima ideia do que um arte-finalista é ou o que faz.

NPS: Defendes que todos os elementos de um estúdio que participem num determinado trabalho devam ser creditados nominalmente pelo mesmo?
DH: É complicado, embora poder ser creditado é sempre bom e algo que defendo. Dependendo da quantidade de pessoas envolvidas, torna-se, por vezes, difícil. Tendo dito isto, havendo a possibilidade, poder ter o nome do estúdio e depois dos artistas envolvidos é sempre o ideal.

NPS: Nos EUA, os arte-finalistas têm a possibilidade de ter acesso a royalties?
DH: Dependendo das editoras e projetos, os trabalhos podem ter royalties e, nesses casos, abrangem também o arte-finalista. A nível de, por exemplo, criação de personagens dentro duma história ou até trabalho autoral, sinceramente, não sei como funciona.

NPS: É frustrante quando a colorização penaliza a arte-final?
DH: Penso que é tão frustrante para um arte-finalista quando a coloração não é a melhor, como deve ser frustrante para o desenhador se o arte-finalista não fizer um bom trabalho. Mas todas as etapas são simbióticas e há sempre uma tentativa de respeitar os artistas que participaram antes.

NPS: E quando recebes uns desenhos que te fazem abanar a cabeça?
DH: Por vezes também acontece receber lápis menos bem conseguidos. Cabe ao arte-finalista tentar melhorar e, por vezes, ir mais a fundo e literalmente finalizar partes que não estejam acabadas no desenho. Tal e qual como, por vezes, se o arte-finalista não conseguir definir, como deveria, os diferentes planos, etc, é a vez do colorista resolver e conseguir melhorar o trabalho do arte-finalista.

NPS: Tens o objetivo de realizar o desenho de comics no futuro? Se sim, julgas que te sentirias tentado a realizar tu próprio a arte-final?
DH: Embora também desenhe, o trabalho profissional que tenho feito foi só como arte-finalista e, muito sinceramente, não tenho ambições de passar a desenhador. Mas nos trabalhos que faço por divertimento, faço a minha própria arte-final, se bem que seria interessante ver alguém a dar a sua interpretação ao meu traço para variar.

NPS: Quais são as razões que te fazem aspirar a um dia trabalhar com Todd McFarlane?
DH: Admiro bastante a sua tenacidade em conseguir chegar onde chegou e é também o criador do personagem que começou o meu amor pela banda desenhava, o Spawn.

NPS: Existe alguma personagem de comics norte-americanos com a qual gostasses de trabalhar em particular?
DH: Pelas razões que mencionei acima, o Spawn é mesmo aquele projeto do coração em que gostaria de poder entrar um dia. Até porque já tenho tido o prazer de trabalhar em bastantes dos meus personagens favoritos, incluindo atualmente com Super-Homem, Batman, Flash e Wonder Woman, entre outras.

NPS: Em que bandas desenhadas estás a trabalhar neste momento?
DH: Neste momento, só estou a trabalhar na revista Justice League Of America, escrita e desenhado pelo Bryan Hitch. Esporadicamente, ajudo noutras revistas, mas só em páginas pontuais.

NPS: A Comic Con Portugal 2014 criou algumas expetativas aos autores presentes quanto ao futuro da sua carreira, quer nacional quer internacionalmente. Julgas que 2015 foi um bom ano para os autores nacionais?
DH: Penso que sim. Vejo a carreira de bastantes amigos no sector cada vez a subir mais a nível internacional, tal e qual como parece que a quantidade e qualidade de publicações nacionais está a crescer de ano para ano.

NPS: Que expectativas profissionais e pessoais tens em relação à edição deste ano da Comic Con Portugal 2015?
DH: A expectativa é sempre a mesma – passar tempo com os colegas e amigos e passar tempo com os leitores. Adoro poder falar do ramo e dos projetos em que estou envolvido e inclusive partilhar as minhas experiências pessoais com artistas aspirantes que pretendem fazer banda desenhada. A Comic Con Portugal facilita e cria as condições ideais para isso.

NPS: Estiveste recentemente na New York Comic Con 2015. Que estratégias desse evento gostarias de ver implementadas na Comic Con Portugal?
DH: Sinceramente, sinto que a Comic Con Portugal trabalha nos mesmos moldes e que tem bastante sucesso no que planeia. Só espero poder ver uma adesão cada vez maior, para poder dar à Comic Con Portugal a possibilidade de continuar a crescer.

NPS: Este ano vais estar novamente presente no Artists’ Alley?
DH: Este ano, não vou estar com mesa no Artist’s Alley, principalmente por ter sido pai recentemente e não me sentir confortável para estar 3 dias inteiros ausente.

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nota: imagens gentilmente cedidas pelo autor.

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