Desenhos Efémeros, de António Jorge Gonçalves

Desenhos Efémeros, de António Jorge Gonçalves

António Jorge Gonçalves, um nome incontornável e multipremiado na Banda Desenhada nacional, após ter obtido o merecido destaque na área do cartoon editorial (na qual também foi premiado e obteve diversas menções honrosas), tem ganho uma importância crescente simultaneamente enquanto autor de livros ilustrados e ilustrador de livros infantojuvenis que não são escritos por si, tendo inclusivamente ganho o Prémio Nacional de Ilustração 2013 com uma obra escrita pelo angolano Ondjaki.

Desenhos Efémeros centra-se noutras facetas do autor, em concreto na realização plástica para teatro e no desenho real em tempo real, a relação entre estas duas e a génese desta necessidade criativa em António Jorge Gonçalves.

Após a catarse de um episódio potencialmente fatal, traduzida pelo autor na narrativa gráfica A Minha Casa Não tem Dentro, o leitor poderia presumir que, no ano em que Gonçalves atinge os 54 anos, plenamente consciente da sua mortalidade após o acontecimento de vida supracitado, o autor se dedicaria a uma autorreflexão sobre a sua carreira neste livro.

No entanto, apesar de Desenhos Efémeros ser, de certo modo, uma dádiva de Gonçalves para que o público interessado possa tomar contacto, de forma cómoda e confortável, com uma porção do seu trabalho extra-literário desenvolvido, e do mesmo conter textos-chave do autor que permitem acompanhar o seu trajeto e fazer luz sobre algumas das suas escolhas, a verdade é que a obra recorre em grande parte à heterorreflexão de quem acompanha com diferentes graus de proximidade a sua vida e obra, seja através de textos com temas específicos para o livro, seja uma reflexão guiada sob a forma de entrevista, da qual podemos visualizar alguns excertos neste vídeo:

Nesse sentido, levantam-se as mais diversas questões e providencia-se espaço para o leitor se questionar sobre diversas temáticas que não se restringem à obra de Gonçalves, sendo antes esta o leitmotiv para questões mais abrangentes, podendo ser um primeiro ponto de partida para que cada leitor trace o seu trajeto, consoante as questões que deseje ver respondidas.

Regressando a Gonçalves, esta obra é mais do que um testemunho daquilo que é impossível registar. Toda a performance ao vivo pode ser obviamente capturada nos mais diferentes meios, dos mais estáticos (como a fotografia) aos mais dinâmicos (como o vídeo). No entanto, mesmo que se conceba uma interatividade do espetador com o registo em vídeo (p.e., uma realidade virtual audiovisual complementada com estimulações de outros sentidos como o olfato ou o tátil), estar-se-á sempre no campo da simulação, que não tem correspondência com a interavidade ao vivo.

O autor desafiou três verdades (in)contestáveis – o processo solitário do ilustrador, a estaticidade cenográfica e a videoprojeção cenográfica transmitida em diferido. Como tal, criou um método pessoal que tornou obrigatória a sua presença em cada um dos espetáculos, para desempenhar o seu papel de ilustrador e cenógrafo, como qualquer outro dos executantes (ator, músico, luminotécnico, sonoplasta, contra-regra, etc).

Em Desenhos Efémeros, a obra, perante a impossibilidade da reprodução das experiências, levanta o véu, através do registo fotográfico, de como poderão ter sido as diferentes performances, sem acesso aos diálogos, à música, à intempérie noturna e ao calor do público circundante. Porque a dinâmica performativa do desenho em tempo real obriga também à presença do público nesse momento.

Uma obra ímpar de um autor ímpar, a qual merece um público muito mais abrangente do que os interessados nos desenhos efémeros.

Eis um trailer do livro:

Clique nas imagens para as visualizar em toda a sua extensão:

Eis a sinopse da editora:

DESENHOS EFÉMEROS documenta a actividade performativa do artista visual António Jorge Gonçalves. Entre 2003 e 2017, António Jorge Gonçalves criou e participou numa série de espectáculos e eventos, como autor de desenho digital em tempo real, a solo ou em diálogo com parceiros tão distintos como os pianistas Bernardo Sassetti e Filipe Raposo, a Orquestra Metropolitana de Lisboa e a coreógrafa Amélia Bentes, entre outros. Profusamente ilustrado com fotografias dos espectáculos, esta obra inclui também textos de Nuno Artur Silva, Carlos Pimenta, Pedro Moura, Rui Eduardo Paes e uma entrevista conduzida por Anabela Mota Ribeiro

António Jorge Gonçalves é ilustrador, performer visual e cartoonista. É autor de diversos livros de banda desenhada, entre os quais a trilogia Filipe Seems (com Nuno Artur Silva) e as novelas gráficas A Arte Suprema e Rei (com Rui Zink), pelas quais foi premiado no Festival Internacional de BD da Amadora. Escreve e ilustra os álbuns Barriga da Baleia e Eu Quero a Minha Cabeça!, ambos publicados pela editora Pato Lógico. Fez direção visual em várias peças de teatro e publica semanalmente, desde 2003, cartoon político nas páginas do Inimigo Público, tendo sido distinguido no World Press Cartoon. Em 2014, recebeu o Prémio Nacional de Ilustração, pelo livro Uma Escuridão Bonita, com texto de Ondjaki.

Desenhos Efémeros
António Jorge Gonçalves
Editora: Orfeu Negro
Páginas: 336
Formato: 19,7 x 25 cm
Encadernação: capa mole com abas
ISBN: 978-989-8868-12-1
PVP: 27,99€

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