Revisita a um primeiro volume assombrado.
Esqueçam os clássicos contos de terror que conheciam, esqueçam as antologias dos irmãos Grimm. Cullen Bunn veio para afirmar que sabe contar histórias à fogueira e garantir que vão deixar arrepios.
Neste artigo não farei importantes revelações sobre o volume e sobre o desfecho do mesmo para quem ainda não tenha lido e o queira fazer. Numa futura revisão, ao segundo volume, serão então mencionados aspetos finais deste volume e do posterior.
A série Harrow County, por Cullen Bunn e Tyler Crook, contou com a publicação de 32 números, compilados em 8 volumes, sendo originalmente editada nos Estados Unidos entre 2015 e 2018 pela publicadora Dark Horse Comics. Em Portugal, a série tem vindo a ser publicada pela G. Floy desde 2016, contando já com 7 (de 8) livros editados.
A série terá sido premiada com um Prémio Ghastly (para melhor série de comics de terror) – bem como dois outros Prémios Ghastly, um para o seu argumentista e outro para o seu desenhador – e nomeada para um prémio Eisner para Melhor Série em Continuação em 2016.
“Assombrações Sem Fim” foi o nome escolhido para o primeiro volume de uma série que prometeu deixar a sua marca e que, claramente, o fez. Este contou com a compilação dos primeiros quatro números e foi editado, originalmente, em dezembro de 2015, conhecendo a edição portuguesa pela G. Floy em 2016. Bunn terá começado a escrever Harrow County em formato prosa, mas não tendo chegado a terminar, deu lugar à escrita do mesmo em formato de banda desenhada. Tyler Crook juntou-se a Cullen Bunn e excedeu-se com uma arte e cor excecionais.
Esta é aquele tipo de banda desenhada que, posso afirmar, será sempre facilmente adorada por qualquer leitor, inclusivamente aquele que tem menos familiaridade com a nona arte. A arte apresentada não é “complexa” ou demasiado detalhada, mas também não é desleixada. Em vez disso, tem a fórmula perfeita para que seja cativante ao olho do mais e também do menos comum dos leitores.
As aguarelas de Crook deixaram-me, por vezes, completamente congelado a admirar a simplicidade e beleza de algumas das capas e uma ou outra página que mais me possam ter “agarrado”. É muito reconfortante ter uma série de banda desenhada que apresenta um trabalho artístico como este, feito “à moda antiga”, tradicionalmente.
A história também não dececionou, presenteando-nos, na verdade, com vários contos de terror em redor de Harrow County, a humilde região campestre e fictícia que Cullen Bunn nos apresentou na obra. Esta é assim uma espécie de história para criança que foi escrita a pensar nos adultos.
O enredo por detrás de Emmy (a personagem principal, uma jovem menina) e da região que esta explora ao longo do primeiro volume não demonstra complexidade; ao invés disso, Bunn simplifica genialmente o que se vai passando ao longo destas 136 páginas. Este é, certamente, o aspeto que mais torna a leitura tão apetecível – o desenvolver claríssimo, com todas as vírgulas e pontos finais, nada ficando por explicar. Um conceito com um enorme espaço para respirar.
Talvez não seja a história extremamente assustadora que procuravam, mas vai ser uma história bastante agradável para qualquer fã de terror. Podemos encontrar sempre aqui e ali semelhanças a histórias que já ouvimos ou já lemos noutro tempo e a familiaridade que isso nos traz faz-nos sentir que já temos a conclusão toda sabida de antemão, mas desenganem-se, porque Bunn veio reinventar os contos de terror com esta série.
As claras influências dos clássicos contos antigos; a pequena aldeia circundada por espíritos de malvadez; a bruxa que foi morta pelos aldeãos e jurou vingança; ou a menina que nasceu da raiz do mal, mas nunca conheceu as suas trágicas origens.
Pois Emmy é uma jovem menina que vive em Harrow County apenas com o seu pai, um humilde fazendeiro com seus animais e um celeiro. A menina sonha com assombrações e os sonhos parecem ser cada vez mais reais. Aos poucos começa a aperceber-se de estranhas presenças em redor de sua casa. Virá brevemente a encontrar-se num mundo que é completamente novo para si e a revelação do passado que nunca conheceu ser-lhe-á dada da forma mais cruel possível quando toda a aldeia sair em sua perseguição com o intuito de a assassinar.
O primeiro volume introduziu-nos às personagens mais importantes, como Emmy e uma das assombrações (um menino que se despe da sua pele), que está sempre do seu lado e a protege de assombrações malignas, entre outros. E introduz-nos a esta bela região campestre com as suas fazendas e quintas, os verdes bosques que a circundam e os límpidos riachos. Apesar do final feliz, bastantes questões ficaram ainda por responder e questiono-me quantos leitores terão ficado curiosos com a última página… A resenha do segundo volume fica para breve… Boas leituras.
Podem ler a sinopse e visualizar os previews da edição portuguesa de Harrow County vol. 1: Assombrações Sem Fim aqui.
Rafael Marques tem 24 anos durante o ano de 2020. É músico em Lisboa e faz disso a sua profissão. A restante parte do seu tempo é dedicada ao sono, ao gaming e à leitura de banda desenhada, que terá descoberto como uma das suas maiores paixões entre 2018 e 2019, quando se envolveu numa relação com uma artista/ilustradora. Rafa é um apaixonado por tudo aquilo em que trabalha. Em segredo, escreve argumentos para banda desenhada, que são executados em belas pranchas pela sua companheira. Ainda sonha um dia vir a ser mordido por uma aranha radioativa…