
O picante primeiro volume de Criminosos do Sexo.
A faixa etária a que se dirige a obra de Matt Fraction e Chip Zdarsky não poderia ser mais clara do que o próprio título sugere. Criminosos do Sexo é uma obra que começou a ser publicada, originalmente, em 2013 pela Image Comics e conta com 2 volumes editados pela Devir em Portugal.
Tem sido, desde então, uma obra muito bem recebida pelo público e terá ganho, em 2014, o prémio Eisner para “Melhor Nova Série”. O primeiro volume compila os primeiros cinco números da série e recebeu o nome de Um Truque Estranho, aquando da sua publicação em Portugal pela Devir, em 2016.
A obra continua a ser publicada nos Estados Unidos, mensalmente, tendo sido anunciado oficialmente pela Image, que os números publicados atualmente fazem parte do arco final da série.

Neste primeiro volume, Fraction apresentou-nos um conceito engraçado para abordar questões sexuais. O título Um Truque Estranho, refere-se à capacidade fantasiosa que Fraction usou para metaforizar a sensação de orgasmo. Suzie e Jon são o casal de personagens principais desta série e a premissa gira em volta, principalmente, dos acontecimentos diretamente ligados à sexualidade de cada um separadamente ou dos dois em conjunto.
Suzie é uma jovem mulher com a “capacidade” de parar o tempo (literalmente) sempre que tem um orgasmo. Jon tem exatamente o mesmo talento. Eventualmente, ambos se encontram e descobrem a sua habilidade comum quando se envolvem sexualmente e têm um orgasmo simultâneo. Jon, que odeia o seu emprego no banco, e Suzie, que precisa de uma enorme quantia para manter a biblioteca onde trabalha, resolvem juntar o útil ao agradável e assaltar o banco para pagar os gastos da biblioteca. O casal acaba, pois, por descobrir que, afinal, não são sequer os únicos com tal capacidade e tudo se complica durante o golpe.
“Cara de Kegel”, a alcunha dada pelos dois à sua opositora, faz questão de os travar e de não permitir que tal habilidade seja usada sem controlo e sem princípios éticos. Esta agrega, então, um par de parceiros e os três fazem-se passar por “polícias do sexo”.
Jon e Suzie acabam por escapar após um confronto com “Cara de Kegel” e os seus parceiros, no fim do qual o volume é dado por terminado, deixando em aberto várias questões. Os dois protagonistas ficam obviamente assustados depois da descoberta destes personagens que, claramente, entendem melhor o funcionamento deste talento do que os próprios.

O primeiro volume desenvolve-se intercalando os acontecimentos presentes (durante o assalto ao banco) e os passados, onde, ora Suzie, ora Jon, nos contam as histórias (sim, os personagens falam várias vezes diretamente ao leitor) de como descobriram as suas habilidades, como se conheceram e como acabaram por chegar àquele momento do presente.
A arte de Zdarsky nesta série não é excecional, mas é suficientemente cativante para prender o interesse do leitor pela história de Fraction. Contudo, Zdarsky não se priva de conceber um ou outro pormenor hilariante e que condiga perfeitamente com a ideia que Fraction nos vai querendo transmitir.
Variados artistas convidados já participaram já nas várias capas alternativas dos números das revistas norte-americanas. São quase sempre capas de contexto erótico explícito, pelo que os números às quais pertencem são vendidos selados.

Pude rever algumas críticas à obra que descreviam o enredo como fraco ou insuficiente. No entanto, pessoalmente, sinto que esta é uma série que não pode ser analisada pelo seu enredo, mas sim como um todo. É claríssimo que Criminosos do Sexo não nos traz a premissa mais original e arrebatadora dos últimos anos, mas não é disso que esta obra trata. Ela é uma “boa desculpa” para os assuntos que implica. Não é primeiramente sobre o tal “truque estranho”, mas sim sobre pessoas e a ligação entre as suas vidas íntimas e o romance do dia-a-dia, sobre aquilo que há em cada um no momento mais íntimo e num dos maiores picos de sensações que o ser humano pode ter. É sobre quebrar assuntos que durante tantos anos foram tabu e abraçá-los casualmente. Jon e Suzie desenvolvem durante este volume uma relação de amor que começou, por acaso, pelo sexo, mas que implica uma conexão e sincronismo que roça a perfeição, não fossem ambos precisar de ter orgasmos simultâneos sempre que quisessem ficar juntos no tempo parado à sua volta. E não esqueçamos que esta é uma série cómica e, nesse campo, quer o argumento, quer a arte, não falharam em arrancar-me umas gargalhadas aqui e ali.
Quem disse que a comédia com a temática sexual já perdeu a piada? Fraction e Zdarsky certamente vieram para negar tais constatações com os seus sentidos de humor…

Rafael Marques tem 24 anos durante o ano de 2020. É músico em Lisboa e faz disso a sua profissão. A restante parte do seu tempo é dedicada ao sono, ao gaming e à leitura de banda desenhada, que terá descoberto como uma das suas maiores paixões entre 2018 e 2019, quando se envolveu numa relação com uma artista/ilustradora. Rafa é um apaixonado por tudo aquilo em que trabalha. Em segredo, escreve argumentos para banda desenhada, que são executados em belas pranchas pela sua companheira. Ainda sonha um dia vir a ser mordido por uma aranha radioativa…
Gostei é muito interessante