Um resumo à atualidade da obra.
A publicação de Gideon Falls pela Image Comics começou em março de 2018. Dois anos depois, continua a ser publicada nos Estados Unidos, tendo sido lançado em fevereiro o número vinte e um, dando por concluído o arco The Pentoculus dividido em cinco partes.
Em Portugal, a série tem vindo a ser publicada pela G. Floy em volumes de capa dura desde agosto de 2019, tendo já sido publicados 2 livros, O Celeiro Negro (previews e sinopse aqui) e Pecados Originais (publicado em dezembro do ano passado). Entretanto, a editora já revelou que o terceiro volume (que compila as revistas #12-16) está agendado para este semestre no nosso país.
Jeff Lemire é o aclamado autor que se juntou a Andrea Sorrentino na criação desta obra de terror da banda desenhada. Possivelmente, um dos seus melhores trabalhos até então, Gideon Falls continua a ser uma das séries mais aclamadas da atualidade.
Lemire, que conta já com vários prémios em trabalhos anteriores, recebeu em 2019, juntamente com Sorrentino, o prémio Eisner para melhor nova série, galardoado a Gideon Falls.
Esta série apresenta um conceito muito original e interessante. A escrita, muito bem desenvolvida, e o traço mais realista de Sorrentino dão à obra um aspeto menos comum que o das típicas publicações das grandes editoras americanas, como uma lufada de ar fresco, a que a Image Comics vai dando espaço.
O que torna o seu estilo artístico tão único é principalmente a sua arte-final, o preenchimento das linhas a caneta, o que é tão pesado.
Ainda assim, um dos aspetos mais únicos e interessantes está na organização das páginas e das vinhetas nas mesmas. Sequências de imagens de uma arte soberba em contextos, por vezes, quase surrealistas, deixam maior abertura à interpretação do leitor. São páginas que nos fazem ficar a observar durante vários minutos sem que necessitem de uma única fala. As vinhetas são organizadas de uma forma também pouco usual, menos padronizada, quase simétrica por vezes, um estilo que é tão único em Sorrentino e que podemos observar em vários dos seus trabalhos.
Outro dos pormenores importantes, e que embelezam ainda mais esta banda desenhada, é cada uma das capas, que se aplicam de forma original e de diferente contexto, conforme o arco em que se insere o número. Nas capas originais, Sorrentino, faz um trabalho excecional, dando-nos as mostras de surrealismo e conferindo um certo mistério ao que se vai passar dentro do livro.
É claríssima a intenção do uso de cores mais mortas e leves por Dave Stewart (colorista da série), para um maior destaque e impacto dado em vermelho vivo e bem carregado em quantidade. A presença da cor vermelha nesta série é um ponto que não conseguimos deixar passar ao lado, tal é a força da sua presença.
A premissa da história é um tanto complexa, mas o que esperaríamos de uma história que nos queira agarrar com mistério? Lemire tenta sempre deixar em aberto uma nova questão apresentada no final de cada número e quando parecemos estar perto de chegar a uma conclusão, uma resposta, logo nos apresenta um novo problema e a questão torna-se ainda maior.
Muito além de uma história de terror, Gideon Falls é uma história de mistério e apresenta-nos isso a cada número. As possibilidades são infinitas.
Até ao ponto em que estamos, continuamos sem saber se lemos uma história cujos acontecimentos são causados por um conceito de ficção científica, se estamos a falar de fantasia ou de religião. No fundo, tudo está em aberto, pode ser uma história de alienígenas, de deuses e demónios, talvez de ciência, ou talvez até de todos eles… Quem sabe, de nenhum?!
Lemire consegue deixar-nos muito bem com água na boca e com a frustração das novas questões que surgem número após número. É claríssima a sua intenção de nos dar a ideia de que somos apresentados a um enredo de universos paralelos, ou viagens no tempo… Ou? Talvez essa “garantia” nos traga apenas mais incerteza e Lemire nos queira dar mesmo a sensação de que sabemos do que trata a história, sendo que na verdade nada do que pensamos é a conclusão mais certa, um pouco como para os personagens da história, que parecem saber tanto quanto os leitores.
A verdade é que, por mais confuso e intrigante que seja, mais vontade dá ao leitor em querer descobrir ou “resolver o mistério” antes que tudo seja revelado… E a revelação, essa, talvez só saibamos na conclusão. Lemire tem-nos muito bem agarrados com esta série e Sorrentino faz questão de o garantir de forma soberba.
Rafael Marques tem 24 anos durante o ano de 2020. É músico em Lisboa e faz disso a sua profissão. A restante parte do seu tempo é dedicada ao sono, ao gaming e à leitura de banda desenhada, que terá descoberto como uma das suas maiores paixões entre 2018 e 2019, quando se envolveu numa relação com uma artista/ilustradora. Rafa é um apaixonado por tudo aquilo em que trabalha. Em segredo, escreve argumentos para banda desenhada, que são executados em belas pranchas pela sua companheira. Ainda sonha um dia vir a ser mordido por uma aranha radioativa…
Acho meio vergonhoso que usem depois páginas da edição inglesa para ilustrar o artigo, e não imagens da versão portuguesa. Como sempre, mesmo nos blogues não se incentiva à edição em língua portuguesa, e nem as capas são mostradas.