Um reconhecimento da clássica obra de Moore.
Um dos mais influentes e reconhecidos autores de banda desenhada, dois dos mais populares personagens de sempre e 48 páginas de pura genialidade – falamos de Batman: Piada Mortal.
Allan Moore praticamente dispensa apresentações. Um dos maiores génios da banda desenhada, conhecido por tantos dos seus grandes sucessos em nome próprio como de obras desenvolvidas, principalmente para a DC Comics. Podemos referir Watchmen ou V de Vingança, entre outros.
Pois foi também Allan Moore que escreveu este, que é um dos mais controversos e influentes livros do “morcego”. Uma obra publicada originalmente em 1988 pela DC Comics e que veio a ver a primeira edição portuguesa 14 anos depois, em 2002, pela Devir. Foi republicado duas vezes pela Levoir nas antologias Super-Heróis DC Comics vol. 5 – Joker: O Último a Rir (2013) e Joker (2019).
Batman e Joker são dois dos mais populares e queridos personagens de banda desenhada de todos os tempos. Além de livros aos quadradinhos, tivemos ao longo dos anos a sua popularização através do cinema, dos videojogos e outros meios. Joker é o irresistível sádico e psicótico vilão (visto por muitos como o melhor e mais bem desenvolvido de todos os tempos) arqui-inimigo de Batman, o galante herói de capa negra, o cavaleiro das trevas.
Esta “dança” herói/vilão entre os dois personagens vem a acontecer desde o primeiro número da série de banda desenhada Batman, em 1940 e, é em 1988, que Moore escreve Piada Mortal, o livro que poria o fim alternativo à mesma.
A partir deste ponto serão feitas revelações que supõem a anterior leitura da obra.
Esta é, portanto, a história que vem trazer o ponto final a um dos dois. O livro começa com o Batman a procurar o Joker numa cela do Asilo de Arkham para conversar sobre este confronto entre ambos, que se vem a repetir tantas vezes há tantos anos. Pretende dar-lhe um final que não seja trágico para qualquer um dos dois.
Ao longo do tempo, vários leitores têm vindo a sugerir diferentes teorias sobre pontos fulcrais na obra que, na minha opinião, ficam sempre deixados à subjetividade interpretativa do leitor e não servem como regra.
Como exemplo, temos um dos momentos que mais marcou o desenvolvimento das páginas deste livro e, parte da razão que o sagrou como “chocante” e controverso na época do lançamento. Refiro-me ao momento em que o detetive Gordon é exposto às imagens de tortura da sua filha. Não sendo uma cena clara nas ilustrações do livro, vários fãs indicam que Joker terá violado Bárbara Gordon, aparecendo esta despida e ensanguentada nas fotos. O próprio choque da mesma ao acordar no hospital e agarrar-se a Batman chorando e contando-lhe que daquela vez o vilão tinha passado os limites, sugere essa visão mais sombria do caso.
Todavia, é a cena final o maior alvo de teorias especulativas dos leitores e uma das razões para não querer largar o livro na conclusão, voltar umas páginas atrás e reler.
Ao ter capturado Joker na cena final, Batman oferece-lhe uma saída não-trágica, dando-lhe a oportunidade de se redimir, curar os seus problemas de psicopatia, etc… Joker recusa, dizendo que é tarde demais e conta a Batman a piada (a que se refere o nome do livro) que no fim o deixa a si próprio em euforia total, gargalhando sem se conter. Batman acaba por ceder e envolver-se também no riso, terminando com o mesmo a pousar o braço sobre o ombro de Joker. Ficamos a ver a chuva continuar a cair e a risada de Joker dissipa-se de uma forma instantânea.
Dificilmente, vemos a possibilidade de assassinato num personagem como Batman, que mantém a sua regra de não matar e, ainda para mais, a situação não nos parece demonstrar tal coisa. No entanto, e com o fluxo da história, além do próprio nome da obra, podemos ficar incertos quanto ao final e, como referido anteriormente, esta foi uma banda desenhada que, alternativamente procurou pôr fim ao confronto Batman/Joker… Este é um dos detalhes mais deliciosos deste livro, o incógnito do final ou a subjetividade interpretativa que Moore deixa ao leitor.
Falar deste livro, que é aparentemente pequeno, podia dar facilmente desenvolvimento a uma apresentação de algumas horas, seguida de um debate. Vários pontos ficam por mencionar, mas queria deixar uma recensão o menos longa possível e direta aos pontos mais marcantes da obra.
O Piada Mortal trouxe um conjunto de novidades à banda desenhada da época, algo que Allan Moore sempre fez desta forma arrebatadora. Todo o desenvolvimento desta curta obra dá-nos uma sensação de que sempre conhecemos os personagens envolvidos, mesmo para mim, que nunca tinha lido uma banda desenhada de Batman.
Não me posso esquecer de mencionar o trabalho de Brian Bolland no desenho e de John Higgins nas cores. Um estilo completamente fundado nas bandas desenhadas clássicas, algo que se nota principalmente nas cores, mas que terá sido conseguido de uma forma bastante notável e que representou o argumento eximiamente.
Esta é uma banda desenhada de leitura quase obrigatória para qualquer leitor do género, quer seja fã das séries da DC e do próprio Batman ou não. É garantidamente uma série que não necessita conhecimento prévio do universo DC para um entendimento da premissa e essa é mais uma razão válida para a sua leitura.
O livro que terá influenciado o próprio Tim Burton nos argumentos dos seus filmes do Batman, mas também videojogos e futuras obras de banda desenhada, não só de Batman, mas em toda a esfera da nona arte.
Arrebatador, fenomenal. Poucos adjetivos descrevem tão bem esta obra.
Rafael Marques tem 24 anos durante o ano de 2020. É músico em Lisboa e faz disso a sua profissão. A restante parte do seu tempo é dedicada ao sono, ao gaming e à leitura de banda desenhada, que terá descoberto como uma das suas maiores paixões entre 2018 e 2019, quando se envolveu numa relação com uma artista/ilustradora. Rafa é um apaixonado por tudo aquilo em que trabalha. Em segredo, escreve argumentos para banda desenhada, que são executados em belas pranchas pela sua companheira. Ainda sonha um dia vir a ser mordido por uma aranha radioativa…