Talvez devessem existir mais curtas-metragens de super-heróis.
Um dos formatos audiovisuais mais excluídos dos últimos anos tem sido a curta-metragem. Não estou a afirmar que existem cada vez menos curtas; aliás, estão a ser produzidas cada vez mais curtas – atualmente, todos têm uma câmara e um microfone minimamente decentes no bolso e existem cada vez mais editores de vídeo grátis ou baratos. Porém, parece que cada vez mais as curtas são consideradas “inferiores” à longa-metragem e que somente são feitas por estudantes de cinema e iniciantes, sendo algo que eventualmente superam.
Isso contribui para que as curtas não sejam populares. Têm existido muitas iniciativas que dão esperança a muitos entusiastas das curtas-metragens que estas regressem ao mainstream. Por exemplo, em 2018, o filme The Incredibles 2: Os Super-Heróis estreou nos cinemas antecedido de uma curta de 7 minutos com o nome de Bao. Para além da surpresa de muitos espetadores, dado mostrar curtas antes dos filmes ser um hábito que se perdeu, as pessoas ficaram impressionadas com o facto de como é que em 7 minutos conseguem contar uma história tão linda e envolvente!
Bao contribuiu para quebrar o estigma de que “curtas não conseguem contar histórias envolventes porque elas são curtas, e isso faz com que nós não tenhamos tempo para nos relacionarmos com a história”, mostrando a um público generalista que as curtas não têm nada que dar satisfações às longas-metragens porque têm uma linguagem e uma forma própria que as diferencia das longas-metragens.
Uma curta não é um filme de 2 horas condensado em 5 a 20 minutos; é simplesmente uma história de tamanho menor.
Têm vindo a existir outras abordagens de promoção de curtas no mainstream, incluindo longa-metragens que são antologias de curtas, como 4 Quartos (realizadas por Robert Rodriguez, Quentin Tarantino, Alexandre Rockwell e Allison Anders) ou Sin City: Cidade do Pecado (Rodriguez, Frank Miller e Tarantino).
No entanto, julgo que uma das melhores tentativas, e uma das mais subvalorizadas, foi o projeto DC Showcase, o qual basicamente consiste numa mostra de curtas de, maioritariamente, personagens de segunda linha da DC. Ao longo destes 10 anos, foram realizadas curtas de The Spectre, Jonah Hex, Green Arrow, Superman/Shazam!, Catwoman, Sgt. Rock, Death, The Phantom Stranger, Adam Strange e Batman.
Também mais ou menos contemporaneamente ao lançamento de DC Showcase (fevereiro de 2010), a Marvel Studios começou a incluir curtas, ou one-shots, nos extras dos DVD dos filmes que lançava. Estes nunca tiveram muito sucesso, talvez por poucos aficionados realmente se dedicarem a ver extras e manking-ofs. A maioria deles funcionava como um pequeno enredo pós-créditos, não tendo a maioria delas relevância para o Universo Cinematográfico Marvel.
Tal como as curtas da Marvel, também as curtas da DC Showcase foram lançadas diretamente para DVD, desta feita servindo como complemento às longas-metragens de animação da DC Universe Animated Original Movies. Em novembro de 2010, as primeiras 3 curtas foram lançadas em formato DVD em conjunto com uma curta original e, apesar das baixas expetativas, arrecadou U$5,208,954, superando o lucro de quase 2 dezenas de longa-metragens de animação da DC, inclusive Batman: The Dark Knight Returns Part 2, Batman vs Robin ou Justice League: The Flashpoint Paradox.
Analisando o DVD em si, a mostra começa com Superman e Shazam: O Regresso de Black Adam, a qual é o ponto de venda do DVD, não só por ter o Super-Homem e ser a única curta original mas também por ser bastante mais longa do que as 3 outras curtas. Penso ser a curta que mais entretém mas, devido à presença do Super-Homem, muitas vezes o Shazam fica ofuscado. Contudo, julgo que tal é o único defeito da curta, sendo a história bastante ambiciosa para uma curta, uma vez que em 25 minutos propõe uma história de origem para o Shazam, implementa um vilão megapoderoso e inclui o Super-Homem, havendo ainda tempo de sobra para cenas de ação e pancadaria.
A história é sobre Billy Batson, rapaz órfão que vive em Filadélfia e que é amigo do Clark Kent (que, num um ponto de vista de comic accuracy não faz sentido, mas não é essa a questão). Um belo dia, estão a tomar pequeno-almoço juntos, quando aparece o Black Adam, que viaja pelo espaço há centenas de anos à procura da Terra para eliminar “o escolhido”.
É depois revelado que “o escolhido” é o Billy Batson, que quando tenta fugir do Black Adam, se torna no Shazam. Super-Homem e Shazam derrotam, de seguida, o Black Adam com a assistência de um tigre (sim, isso acontece)… e fim.
Se a curta de Superman e Shazam é uma premissa comum no universo dos super-heróis, as outras curtas tentam-se diferenciar um pouco disso, com cada uma a abordar um género diferente, o que funcionou muito bem num formato de antologia porque deixou a experiência muito mais completa.
No entanto, para além disso, as outras curtas não têm muito que se lhe diga.
A do Arqueiro Verde é uma curta de ação com laivos de drama político e thriller. No entanto, ainda apresenta uma atmosfera muito próxima de um filme de super-heróis.
Quanto à de Jonah Hex é um western com cenas de ação dos anos 2000.
E a do Espectro é uma curta de terror com laivos de thriller e policial.
Em conclusão, o DVD DC Showcase é uma experiência muito divertida e que vai (ou não) dar ao espetador uma boa impressão destas personagens, que talvez não conhecesse.
As 6 curtas seguintes da DC Showcase, dedicadas a Mulher-Gato, Sgt. Rock, Morte (de Sandman), Vingador Fantasma e Adam Strange, não foram reunidas num formato de antologia, existindo em formato físico somente como extras de diversos DVD do DC Universe Animated Original Movies.
Por fim, no mês passado, foi lançado em blu-ray e DVD a mais recente curta-metragem da DC Showcase. Intitulada Batman: Death in the Family é uma curta interativa baseada na minissérie de banda desenhada homónima. Existindo 8 finais diferentes, compete ao espetador fazer as escolhas do que acontece para vivenciar cada um deles.
Desde que aprendeu a ler, gasta o seu tempo a ler banda desenhada e a ler legendas de filmes de ficção científica, e desde que ganhou esse hábito com muito poucos anos, não se perdoa a si mesmo por não ter investido mais tempo em equações e contas de multiplicar.
Após uma experiência com um canal de Youtube sobre filmes e BD, João usa o seu tempo livre para escrever críticas de cinema e ensaios sobre as suas longa-metragens e livros favoritos. Se estiver mesmo com azar, vai-o encontrar a andar pelas ruas de Lisboa, muito provavelmente à procura de DVDs a preços acessíveis, o que explica porque anda sozinho.