O mais recente trabalho de Ricardo Baptista.
Planeta Satélite #2 é o nome que dá continuidade à série de Ricardo Baptista em formato fanzine, cujo primeiro número foi publicado pelo autor em 2017. O mais recente número contém vinte e duas páginas de banda desenhada a preto e branco (ou tons de cinza, diria) e compila quatro histórias curtas.
A modesta revista está muito bem estruturada e transmite uma boa sensação de beleza e equilíbrio, quer na capa e contracapa, quer no seu interior.
Todas as histórias me ficaram a saber a pouco, mas tratando-se de um fanzine, é apenas natural que não se desenvolvam premissas complicadas e arrastadas. Num lado positivo, o argumento de Ricardo Baptista é, até, bastante agradável, no sentido em que é focado e não se perde na narrativa – é direto ao ponto.
Foco para a primeira e para a última histórias que foram, para mim, as mais cativantes e curiosas, uma vez que são também as duas histórias que são deixadas em aberto, com finais inconclusivos para possíveis continuações no próximo fanzine (sugerido pelo autor para abril de 2021).
A primeira história, A Cidade de Dis, é apresentada como um prólogo, pelo que acredito que vários capítulos se seguirão apesar deste ser ainda bastante reservado e apresentar uma imagem muito pouco delineada do que se seguirá.
Seguimos o personagem Iblis logo após a sua queda num mundo inóspito. Não sabemos muito bem onde a viagem o vai levar, mas a história promete a continuação.
Retrato é a segunda história presente e, diz o autor, que se trata de uma BD romântica sobre aparências, preconceitos e amor. Terá sido o trabalho com o qual concorreu ao Concurso de Banda Desenhada de Odemira.
Esta BD invoca alguns elementos interessantes, principalmente na forma como as vinhetas se organizam, dando-lhe profundidade e presença.
Diz o autor que Dream Sequence seria a BD que ia enviar para a revista kuš cujo tema era “The End”.
Nesta curta BD, o autor apresenta um traço mais desleixado, menos embelezado, quer nas linhas, quer nas sombras. Esta técnica explica-se por se tratar de uma temática mais negra, com uma grande presença noturna, quase terrorífica.
Dream Sequence deixa a sensação de ser a história mais curta das quatro, apesar de essa ser, na verdade, a anterior, com apenas três páginas. A terceira história tem menos diálogo e lê-se “num piscar de olhos”.
Embora pareça um pouco abstrata e, de certa forma, “começar a meio”, o autor refere que esta terá sido influenciada por um episódio da infância de David Lynch relatado pelo próprio numa cena presente no documentário David Lynch: The Art of Life.
A quarta e última história chama-se Hipnotopia e foi, para mim, a mais misteriosa, curiosa e interessante. Nesta encontramos uma interessante “fantasia urbana” (como o autor descreve) onde Luís, o protagonista, explora a importância dos sonhos na sua vida e onde recebe uma proposta que é tão estranha quanto caricata. É provável que encontremos alguns elementos narrativos que nos remetam para a mítica série de banda desenhada Sandman, mas é especialmente sublime a pequena referência à banda Metallica que nesta podemos encontrar.
Fico especialmente expectante pela continuação desta última história, depois de um fanzine que demonstra uma abordagem madura na arte e no argumento. Apesar de relativamente simples, sem detalhes rigorosos e hiper-realistas, a arte de Ricardo Baptista é bonita e envolvente.
Aponto apenas alguns casos em que a legendagem poderia ter uma organização melhor e talvez um pouco menos de espaçamento entre linhas. Pessoalmente não fiquei fã da balonagem de forma completamente redonda, mas na sua organização, pelo menos, esta aparenta ser bastante instintiva e clara, sem apresentar quaisquer entraves ou problemas para a leitura, que é, no fundo, o mais importante.
Uma breve, mas refrescante entrada no panorama da banda desenhada nacional a encontrar publicação no final do ano. Esperançosamente os fanzines de Ricardo Baptista tornar-se-ão mais regulares e periódicos.
A revista encontra-se disponível pelo valor de 4,00€ e poderá ser adquirida nas lojas de especialidade ou através do e-mail: planetasatelite@gmail.com
Planeta Satélite n.º 2
Ricardo Baptista
Editora: Planeta Satélite (ed. autor)
Páginas: 24, a preto e branco
Encadernação: agrafes
Dimensões: 170 x 260 mm
PVP: 4,00€
Rafael Marques tem 24 anos durante o ano de 2020. É músico em Lisboa e faz disso a sua profissão. A restante parte do seu tempo é dedicada ao sono, ao gaming e à leitura de banda desenhada, que terá descoberto como uma das suas maiores paixões entre 2018 e 2019, quando se envolveu numa relação com uma artista/ilustradora. Rafa é um apaixonado por tudo aquilo em que trabalha. Em segredo, escreve argumentos para banda desenhada, que são executados em belas pranchas pela sua companheira. Ainda sonha um dia vir a ser mordido por uma aranha radioativa…