E se o Elfo Americano andasse à caça de rabiosques na cidade invicta?

E se o Elfo Americano andasse à caça de rabiosques na cidade invicta?

Heróis Estrangeiros de Visita a Portugal III.

E se o Kim Kebranoz corresse pelas ruas do Porto? Ou a família Franval rumasse à Madeira? O Elfo Americano apreciasse os rabiosques da Invicta? E o Howard Flynn fundeasse em Lisboa?

Pois é! Aqui vai a terceira incursão de Heróis Estrangeiros de Visita a Portugal. Desta vez são apenas quatro aventuras, as últimas que consegui encontrar ou que me foram sugeridas. Não quer dizer que não haja mais, mas para isso fico à espera de sugestões.

Como sempre, estas aventuras em Portugal são apresentadas por ordem alfabética do herói e sem me deter muito nos enredos, mas mais na visita em si e numa ou outra curiosidade.

Vamos aos livros!

BENOÎT BRISEFER (KIM KEBRANOZ)

Benoît Brisefer, Volume 1
Título: Les taxis rouges
Escritor: Peyo
Desenhador: Peyo
Cenários: Will
Capa: Peyo
Editora: Dupuis
Publicado em janeiro de 1962

O pequeno herói Benoît Brisefer foi criado por Peyo em 1960 para a revista Spirou e publicado em álbum dois anos mais tarde.

O criador dos Schtroumpfs (nome original dos americanizados Smurfs) deu vida a um rapazinho que vive na pacata vila de Vivejoie-La-Grande e que esconde um segredo: ele possui uma força sobre-humana e todos os poderes que daí advêm. Mas perde-os momentaneamente quando se constipa. As suas aventuras mirabolantes andam entre o registo do policial e da espionagem ou mesmo do fantástico.

Na sua primeira aventura, “Os Táxis Vermelhos”, que foi publicada no nosso País pela União Gráfica em 1962 (o mesmo ano da edição original), Benoît ou Kim Kebranoz como foi baptizado cá pelo burgo, vê a sua Vivejoie-La-Grande (Vila Girassol) ser invadida por uma moderna empresa de táxis que serve de fachada a negócios ilegais e que faz concorrência desleal ao seu amigo e companheiro de aventuras, Jules Dussiflard (o Sr. Vicente).

Depois de ser enganado pelo gang, de ser enviado numa longa viagem e de ir parar a uma ilha deserta, Benoît tem de regressar a todo o custo à sua serena vila de modo a impedir o golpe final dos malfeitores. Mas é vítima da sua própria super-velocidade e erra o destino final. É assim que vem parar a Portugal, mais concretamente aos arredores do Porto.

A sua visita a Portugal resume-se a esta prancha, da qual devo destacar o português perfeito que é utilizado nas duas falas e os trajes tradicionais dos personagens lusitanos (um cliché que já vimos acontecer em aventuras apresentadas nos artigos anteriores de Heróis Estrangeiros de Visita a Portugal).

Curiosamente, em 2014 Les táxis rouges tem estreia cinematográfica em França, sendo que grande parte das cenas, sobretudo as localizadas em Vivejoie-La-Grande, são filmadas em Lisboa – no Largo da Graça, em Xabregas ou na Estrela – e arredores.

No elenco estão dois actores consagrados. Gérard Jugnot interpreta Jules Dussiflard, o taxista, melhor amigo de Benoît. E ao internacionalmente famoso Jean Reno cabe desempenhar o vilão de serviço.

A crítica dividiu-se. Na minha opinião, não só é uma boa adaptação do álbum como tem um certo charme deliciosamente rétro que me seduziu e reconfortou. Pena é que não tenha sido lançado no mercado de DVD em Portugal.

ELFO AMERICANO

American Elf, Volume 1
Título: “American Elf 1999”
Escritor: James Kochalka
Desenhador: James Kochalka
Capa: James Kochalka
Editora: Top Shelf
Publicado em agosto de 2004

Para quem não conhece, o conceito é simples. Todos os dias (ou quase), James Kochalka desenha uma tira de BD (uma comic strip à americana) na qual cristaliza um momento da sua vida, numa espécie de diário ilustrado. Fê-lo de 1999 a 2014, com um humor aparentemente simples e até disparatado, mas na verdade profundo, onde o retrato do momento mais banal da vida humana pode ganhar um significado inusitado.

Ora, Kochalka esteve no nosso país em 1999, a convite do Salão Internacional de BD do Porto (SIBDP) e não poderia deixar passar o acontecimento sem umas entradas no seu diário ilustrado.

Este é o volume de abertura da série e inclui tiras do final de 1998 e de todo o ano de 1999. Nele, Kochalka (ou o Elfo Americano) aluga um novo apartamento, toma conta de um gatinho doente, compra um iMac, bebe imenso e visita Portugal.

Seguem-se duas das tiras referentes à cidade do Porto que foram publicadas no 1.º volume da 3.ª série da Quadrado, coeditado pelo SIBDP e pela Bedeteca de Lisboa em 2000.

OS FRANVAL

Les Franval, Volume 1
Título: Destination Desertas
Escritor: Yves Duval
Desenhador: Édouard Aidans
Capa: Édouard Aidans
Editora: Le Lombard
Publicado em janeiro de 1968

Série franco-belga das décadas de 1960-1970, Les Franval relata as aventuras da família do mesmo nome, aventureiros, exploradores e conferencistas, sempre à caça de reportagens pelos quatro quantos do mundo.

No seu Volkswagen Combi (VW T2), Marc Franval, a sua mulher Cathy e o seu filho Didi procuram as melhores imagens do reino animal que servirão para o cineasta realizar os seus documentários. No processo, envolvem-se sempre em grandes aventuras com bandidos, traficantes de armas e de animais, contrabandistas e até piratas modernos. De uma maneira ou de outra, os malfeitores estão sempre ligados ao “crime ecológico” e racial.

A série teve direito a 12 álbuns, sendo que o quarto é passado em Portugal.

Logo na capa podemos ver a Torre de Belém com o Tejo em pano de fundo numa versão e com palmeiras (que ainda por lá existem, pelo meio dos pinheiros) em outra versão.

Toda a acção se passa em Portugal, começando pela entrada dos Franval em território nacional pela fronteira de Vilar Formoso. Os co-protagonistas, um casal português amigo de Cathy, vivem na “Costa do Sol”, numa propriedade que parece situar-se algures na Quinta da Marinha em Cascais.

Entre inúmeras peripécias, há perseguições no meio de Lisboa, uma atribulada fuga pelo meio de uma praça de toiros (com direito a cavaleiro de chapéu à mazantino e forcados) e, por fim, o desenrolar da aventura no arquipélago da Madeira, mais concretamente nas Ilhas Desertas, para onde vão a bordo do “Évora”.

Não sei se Édouard Aidans visitou alguma vez Portugal, mas parece ter-se documentado convenientemente.

HOWARD FLYNN

Howard Flynn, Volume 2
Título: À l’Abordage
Escritor: Yves Duval
Desenhador: William Vance
Capa: William Vance
Editora: Le Lombard
Publicado em janeiro de 1968

Série criada por Yves Duval (o mesmo argumentista de Les Franval) e por William Vance (o magnífico desenhador de XIII, Ramiro e Bruce J. Hawker), contou com três álbuns publicados respectivamente em 1966, 1968 e 1969 e com o 6.º volume da série de integrais Tout Vance, publicado em 2002 que agrega os três álbuns e várias histórias curtas do herói.

Howard Flynn é filho do conde De Flynn. Decidindo distanciar-se de uma vida na política igual à de seu pai, decide alistar-se na Marinha Real Britânica frequentando a High Naval School. Já como primeiro-tenente, embarca no Aquiles onde irá viver as mais diversas aventuras, nos perigosos mares dos finais do século XVIII e começos do século XIX. É, por isso, contemporâneo de Lorde Nelson, das grandes batalhas navais entre ingleses e franceses, apanhando ainda o período áureo da pirataria nos mares do Sul.

O álbum que para aqui nos interessa é o 2.º e teve direito a edição nacional em 1969, onde foi publicado pela Editorial Ibis em 1969 com o título À abordagem.

O almirantado britânico encarrega Flynn de ir a Lisboa ao encontro da filha do embaixador inglês no Brasil e de escoltá-la até às terras de Vera Cruz.

A travessia do Atlântico vai revelar-se difícil e perigosa, sobretudo devido aos variados inimigos da coroa britânica.

A escala que o Aquiles faz em Lisboa é apresentada ao longo de apenas quatro pranchas, mas serve como bom exemplo do sentido de pormenor, da aturada investigação e nas cuidadosas reconstituições históricas que tornaram Vance reconhecido internacionalmente, sobretudo nas suas séries Bruce J. Hawker  – nos mesmos ambientes de Howard Flynn – e Ramiro – passado na Espanha Visigótica.

Como curiosidade, é de referir que Vance fez uma viagem a Lisboa em 1964, momento em que aproveitou para conhecer as zonas históricas da cidade e para desenhar vários esboços, nomeadamente da Torre de Belém (que surge nesta aventura).

De assinalar o cuidado na reprodução das embarcações típicas do Tejo – as “canoas” – à saída do estuário.

TURMA DA MÔNICA

Turma da Mônica
Título: “Uma Viagem a Portugal – As Diferenças do Português Falado no Brasil e em Portugal”

Escritor: José Santos
Desenhador: Estúdios Mauricio de Sousa
Editora: Leya Brasil e IMEPH
Publicado em 2013 e 2017

Este é um livro que não é propriamente de banda desenhada mas é profusamente ilustrado com os personagens sobejamente conhecidos dos “gibis” – Mônica, Cebolinha, Cascão e Magali – que, numa viagem a Portugal, são guiados pelo António Alfacinha (ver os “extras” no final deste artigo) que lhes dá a conhecer as diferenças do português de Portugal e do Brasil.

Na capa da edição da Leya Brasil podemos ver o Cascão com a camisola da nossa selecção nacional de futebol, o Cebolinha com o bigode que os brasileiros acham que todos os portugueses usam e a Mónica e a Magali envergando trajes minhotos.

Já na capa da IMEPH, a Mónica veste uma t-shirt com o Galo de Barcelos e a Magali, sempre esfomeada, delicia-se com um Pastel de Belém.

Como fundo de ambas as capas, um painel de azulejos tipicamente português, no qual, se observarem atentamente, está o coelho da Mónica, também ele com o dito “bigode português”.

A obra, dividida em 13 capítulos, trata mais de 250 palavras típicas do nosso português, inserindo-as em contextos específicos da viagem. Por exemplo, quando a Turma da Mónica viaja para Portugal, fá-lo num avião da TAP e nessa cena explica-se o mesmo significado de “hospedeira de bordo” e “aeromoça”.

E ao longo da viagem lá vão aparecendo locais conhecidos de Portugal como é a zona da Ribeira no Porto e os seus barcos Rabelos.

EXTRAS

Por falar em Turma da Mônica, Mauricio de Sousa criou em julho de 2007 o António Alfacinha. A sua primeira aventura surge na revista Cebolinha (1.ª serie) n.º 7 da Panini.

António Alfacinha, ou simplesmente Alfacinha, é irmão mais novo do Manezinho (outro membro da turma) e foi morar para o Brasil. Veste-se com as cores da bandeira portuguesa e o seu cabelo faz lembrar um bigode farfalhudo (outra vez a fixação nos bigodes). Tem uma paixão pela Mônica, o que lhe vale, logo na primeira aventura, uma das conhecidas tareias da mais famosa “dentuças” do planeta.

Muitos dos gags jogam com as diferenças do português falado em Portugal e no Brasil (ou do português que no Brasil se julga ser falado em Portugal, incluindo a sua fixação no “ora pois”).

E é com este aventureiro luso em terras de Vera Cruz que penso ter terminado a série de artigos de Heróis Estrangeiros de Visita a Portugal.

No entanto, como já acima se disse, se o caro leitor conhecer alguma aventura de um herói estrageiro de banda desenhada que se tenha aventurado no nosso País, deixe o seu comentário mais abaixo e pode ser que ainda haja matéria para mais um artigo.

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