
Análise de Criminal: Livro Quatro.
A série Criminal do duo Ed Brubaker e Sean Phillips tem sabido explorar os clichés do género policial de forma realista. Galardoada com diversos Prémios Eisner e, entre nós, com o de Melhor Série nos Prémios Bandas Desenhadas 2019, tem conquistado por todo o mundo leitores, sejam eles apreciadores ou não do género policial na banda desenhada em particular ou de uma forma geral.
Como é habitual na série, a leitura de cada volume pode ser feita de forma completamente independente, apesar de ser mais recompensadora para os leitores habituais de Criminal, dado se acompanhar, ao longo de várias décadas, elementos da família Patterson e Lawless, bem como de outros personagens.
Ao contrário do que afirma na ficha técnica da edição nacional (mostrando como é importante que a revisão se estenda a esta), o material compilado em Criminal: Livro Quatro (cf. apresentação, sinopse e previews da edição portuguesa da G. Floy aqui) tem origem nas revistas Criminal Special Edition (originalmente publicada em 25 de fevereiro de 2015) e Criminal 10th Anniversary Special (20 de abril de 2016) – que, realmente, foram compiladas no livro de capa mole Criminal vol. 7: Wrong Time, Wrong Place (identificado como uma revista na ficha técnica) – e do livro de capa dura Bad Weekend (10 de julho de 2019) – identificado também como uma revista na ficha técnica, quando na realidade compila as revistas Criminal (Image) #2-3, bem como material novo que não constava das mesmas. O que têm em comum todas estas histórias é uma homenagem à própria banda desenhada, como analisaremos.
Espada Selvagem de Criminal

Como os leitores portugueses podem vislumbrar com a ilustração que se reproduz acima (cuja incorporação na edição nacional se saluda e apenas se lamenta a reduzida dimensão com umas extensas margens negras desnecessárias), a homenagem de Brubaker & Phillips à revista Espada Selvagem de Conan foi além da incorporação de algumas páginas da banda desenhada da imaginária revista “Sword of the Savage” dentro da BD de Criminal Special Edition.
No entanto, contextualize-se a edição deste one-shot. Se Criminal tinha sido publicada entre 2016 e 2011 pela chancela Icon da Marvel, num total de 26 revistas, ao longo de 4 séries diferentes (que as compilou em livros de capa mole e edições denominadas de luxo em capa dura), em janeiro de 2015 a série começou a ter os seus livros em capa mole a serem republicados pela Image. Seria cerca de um mês depois, com este one-shot, que surgiria a primeira BD original de Criminal na nova editora, ao fim de quase 4 anos de hiato, tendo durante os 3 anos anteriores Brubaker pensado que não regressaria à serie, dado não saber como superar o sucesso do arco “O Último dos Inocentes” (publicado entre nós em Criminal: Livro Três).
Segundo Brubaker, a inspiração para esta BD teve diferentes origens. Por um lado, aquando do início da série Criminal, recebia ocasionalmente correio de fãs da série que se encontravam na prisão, o que o recordava de alguém lhe ter dito que a revista a preto de branco da Marvel Savage Sword of Conan, nas décadas de 70 e 80, tinha bastantes presidiários como assinantes. Portanto, quando Brubaker decidiu criar uma revista para Criminal, a primeira imagem que lhe veio à cabeça foi Teeg Lawless a ler uma BD sobre um bárbaro, sentado na prisão. Estranhamente, a tradução portuguesa optou por ter a liberdade criativa de renomear o personagem como Zanghar, ao invés do nome com que o Brubaker o batizou, Zangar.
Quanto à história de Zangar (cujo nome nos soa muito familiar a Ka-Zar, personagem semelhante a Tarzan que foi transposto da ficção pulp para a BD pela Marvel na década de 30 e reformulado na década de 60 com um novo alter ego), é inspirada no filme policial de 1967 À Queima Roupa (Point Blank, no original) – do realizador John Boorman e contando com Lee Marvin como protagonista -, que, por sua vez, adaptava O Caçador, o primeiro romance policial de Richard Stark da série Parker, cuja adaptação à banda desenhada por Darwin Cooke foi publicada em Portugal pela Devir.
Mas se Teeg Lawless vai lendo a aventura de Zangar durante a sua estadia na prisão, com algumas das suas páginas a serem reproduzidas dentro da própria BD, a homenagem dos autores de Criminal à Espada Selvagem de Conan não termina aí. Na verdade, os autores fizeram uma versão alternativa do one-shot, na qual recriaram toda uma revista daquela época, desde o índice e um mapa da Era de Zagar de acordo com o mapa original de Alfred Ravenscroft nos seus romances (sim, tal como Conan, também Zangar tem origem naqueles), aos anúncios da contracapa (à qual não escapa um autocolante simulado com o endereço da prisão que faz a assinatura da revista) e às cartas dos leitores. Para o correio dos leitores, Brubaker solicitou, inclusivamente, a amigos que, baseando-se na secção do correio de Savage Sword of Conan, escrevessem as missivas, respondendo eles às mesmas com base nas respostas da época. Todo esse material substituiu, deste modo, o material extra na revista com a versão standard, mais centrada no making of da banda desenhada.
É um facto que estes pormenores não se encontram na versão standard da revista nem na compilação em capa mole que a engloba e que, portanto, estão ausentes também na edição portuguesa. Como já tivemos oportunidade de explanar no passado, as séries e minisséries de Brubaker e Phillips têm obrigado a que os leitores olhem com especial interesse para as revistas norte-americanas de BD, os denominados comic books. Já há mais de uma década, desde que a compilação de revistas em livro passou a ser quase praticamente um dado adquirido ao invés de algo veramente excecional, reservado a poucos títulos, que editores e autores têm-se defrontado com uma percentagem significativa de leitores que não adquire as séries em fascículos e aguarda pelo livro – e, entre estes, também há quem aguarde pela simples compilação em capa mole, por uma edição em capa dura ou por uma edição luxuosa de maiores dimensões e repleta de extras. Numa tentativa de inverter a tendência dos extras nas edições mais luxuosas e valorizar mais a publicação em curso das séries em fascículos, Brubaker e Phillips têm colocado nas revistas das suas diferentes séries artigos de vários autores não necessariamente diretamente ligados à história narrada naquele número, mas sobre diferentes temáticas ligadas ao género abordado, época retratada ou outros assuntos. Esses artigos não são apresentados posteriormente nas antologias (ou é apenas selecionado um ou outro), para desespero dos seus fãs que anseiam por edições integrais das suas obras, não tendo outra hipótese se não a de adquirir as revistas, caso desejem ter esses artigos na sua posse. No caso da Criminal Special Edition, todo o material extra supracitado da versão alternativa da revista não se encontra na antologia em capa mole, estando reservada para a edição dita de luxo em capa dura. No entanto, mesmo nesta, a BD apresenta o bleeding idêntico ao da versão standard e não ao da revista alternativa (que apresentava maiores dimensões, à semelhança da Savage Sword of Conan), sendo cortados alguns pormenores da arte, como demonstra esta figura:

Refira-se que não é a primeira vez que Criminal homenageia a própria banda desenhada, tendo no passado já se dedicado às tiras de BD policial e aos próprios personagens do universo de Archie.
Quanto à BD propriamente dita deste one-shot, teria um enredo simples, não fosse a sua homenagem à banda desenhada. Dá ao leitor a oportunidade de reencontrar Teeg Lawless em 1976, numa altura em que se encontra preso durante um mês. A única questão é que a sua morte foi encomendada e, portanto, a permanência de 30 dias enclausurado revela-se um teste de resistência, lembrando aos leitores o quão implacável Teeg consegue ser.
Relembre-se que se trata também da época em que a BD era vendida nos EUA nos pontos de venda de periódicos. E, portanto, os autores, para lá dos muros da prisão, presenteiam-nos com uma ilustração de um quiosque onde se vislumbram muitas publicações da altura, como Man-Thing, Doctor Strange, The Amazing Spider-Man e The Defenders, entre outros. Há também uma certa referência a uma BD de título aliterado denominada Mikey Millions para crianças. E é também fora do ambiente presidiário que se dá o reencontro com Tracy Lawless, um dos filhos de Teeg, e que será a ponte para a história seguinte. A interação entre os dois ajuda também a perceber melhor estes personagens.
Nas páginas de Zang(h)ar, por vezes simbióticas com a história de Teeg, Sean Phillips, longe do seu registo habitual, demonstra que realizou com afinco a sua pesquisa, presenteando o leitor com poses e demais clichés da época, bem como os próprios processos de impressão de então.
A nível de meta-referências, não deixa de ser curioso que os nomes de Brubaker & Phillips surjam na capa de Savage nas mãos de Teeg, como se colocassem os autores como personagens do universo de Criminal, nomeadamente como autores de banda desenhada da década de 70. Por outro lado, é um facto que o nome de Alfred Ravenscroft só surge nos extras da versão alternativa da revista. Mas os leitores do duo Brubaker e Phillips certamente se recordam de quem este personagem é – o escritor pulp que surge na série Fatale e cuja vida se assemelha à de Robert E. Howard, o criador de Conan, enquanto a sua escrita lembra não só a de Howard mas também a de H.P. Lovecraft. No entanto, não sendo algo existente na própria BD e dada a diferença de abordagens nas duas séries – pode-se considerar Fatale como uma série de fantasia, ao abraçar o sobrenatural, ao contrário de Criminal, alicerçada na realidade -, deve ser encarado mais como um piscar de olho aos leitores das obras do duo do que uma pista de que as duas séries coexistem no mesmo universo.
Quanto à edição nacional, na tradução houve o cuidado de colocar, quando apropriado, um discurso informal nos personagens, mesmo quando não presente no original, mas que não descaracterizou a obra, ao contrário de outras traduções recentes. Na legendagem, optou-se por não aportuguesar as onomatopeias nem traduzir textos em localizações como avisos, revistas, nomes de lojas e afins nas vinhetas, o que, pessoalmente prefiro, pois o resultado causa frequentemente ruído na imagem e fica aquém do original. Apenas se lamenta o efeito do ácido no discurso de Teeg (na cena graficamente inspirada na obra de Moebius) se ter parcialmente perdido ao não conseguir mimetizar a diferença progressiva do tamanho dos diversos caracteres na constituição das palavras, tão próprias de uma década, para o substituir por um simples ondular do texto.
As mãos mortíferas de Criminal

Criminal 10th Anniversary Special foi lançada originalmente um ano depois, como o título indica por ocasião do 10.º aniversário da série, sendo o segundo trabalho original de Criminal publicado pela Image. Sendo mais um one-shot, os autores decidiram novamente realizar uma versão alternativa da revista, Deadly Hands of Criminal.
Se a referência e trocadilho de Criminal com a Espada Selvagem de Conan é simples para os leitores portugueses, Deadly Hands poderá ser mais rebuscada. Na verdade, The Deadly Hands of Kung Fu era uma revista de banda desenhada dos anos 70 semelhante à Savage Sword of Conan, mas dedicada às artes marciais, na qual conviviam as aventuras de Shang Chi (o Mestre do Kung Fu), Punho de Ferro, Filhas do Dragão (Colleen Wing e Misty Knight), Filhos do Tigre e Tigre Branco. No Brasil, as bandas desenhadas de The Deadly Hands of Kung Fu foram publicadas inicialmente pela Ebal na revista Kung Fu e posteriormente pela Bloch na revista Mestre do Kung Fu.
Os autores realizaram uma fórmula semelhante, tendo a versão alternativa desse one-shot novamente direito a um índice e a um anúncio falso (e divertido) de ensino à distância, sendo a secção de cartas dos leitores substituída por um artigo editorial sobre adaptação dos seus heróis ao cinema, próximas novidades nas histórias e um checklist de revistas. Tudo isto, mais uma vez, não se encontra na antologia de capa mole que compila os dois one-shots (Criminal vol. 7: Wrong Time, Wrong Place), nem, portanto, na edição portuguesa, onde apenas consta a capa alternativa com as já supramencionadas e desnecessárias extensas margens pretas.
De março de 1976 da primeira história, avançamos para o verão de 1979 (e não retrocedemos para 1972, como erradamente está escrito na contracapa nacional, local ao qual a revisão também tem forçosamente de se estender). Ao invés das 48 páginas do primeiro one-shot, o segundo one-shot é composto por 64 páginas (uma tendência crescente que se manteria com a terceira publicação original de Criminal na Image, já não uma revista mas um livro de capa dura de 72 páginas denominado Os Meus Heróis Foram Sempre Drogados, que a G. Floy já publicou no nosso país em 2019, dando-nos a oportunidade de rever a menina de Cobarde, o primeiro arco de histórias da série, bastantes anos mais tarde).
Nesta segundo one-shot, os autores exploram um pouco mais a relação de Tracy, agora com 12 anos, com o seu pai. Segundo Brubaker, a história espelha reminiscências da sua infância depois dos seus pais se separarem, mais concretamente com o passar dias sozinhos com o pai ou pernoitarem em motéis baratos quando realizavam viagens de carro. Para além da dinâmica retorcida entre Teeg e Tracy, o leitor depara-se com uma história que oscila entre a ternura e a tragédia.
Quanto à história de Fang, o Lobisomem do Kung Fu, a BD dentro da BD, contém as sementes para o que se viria a tornar Kill or Be Killed, uma série de 20 números de Brubaker & Phillips publicada pela Image entre 2016 e 2018, entre o thriller e a desconstrução do vigilantismo, inédita no nosso país. Tracy utiliza a leitura de BD como uma forma de escapismo da realidade difícil em que se encontra, enquanto os autores, por vezes, mimetizam na BD o estado emocional de Tracy. E, mais uma vez, os nomes dos autores estampados na capa da revista de Tracy são Brubaker e Phillips.
Phillips faz novamente um trabalho notável, quer na BD de Fang quer na BD que a alberga. Na primeira, certamente os leitores serão transportados nostalgicamente para aquela era, sentindo uma intensa familiaridade com uma BD que, afinal, nunca leram. Quanto a Criminal, repare-se, por exemplo, nas tão diferentes expressões dos jovens Tracy e Gabby ao longo da BD, transmitindo aos leitores todo um universo de emoções.
Por outro lado, os autores mostram novamente locais onde os comics podiam ser adquiridos nos EUA, desde os supermercados aos alfarrabistas, podendo os leitores se entreter a reconhecer diversos títulos expostos.
Entretanto, atente-se no pensamento de Tracy (ou de Brubaker, se preferirem) sobre a BD de Fang:
Esta BD é esquisita… Às vezes lembra-me um pouco as do meu pai… Mas essas têm mulheres nuas e cenas assim… E esta, sinto que devem estar quase a aparecer mulheres nuas a qualquer momento. Como se fosse um comic para miúdos a fingir que é para adultos.
– pg. 63
A tradução e legendagem mantém os mesmos princípios da história anterior. Pessoalmente, continuo a não gostar do emprego omnipresente de “dum” e “duma”, utilizado por certos tradutores nacionais de forma a poupar o número de caracteres nos balões, devido à tradução portuguesa originar frequentemente mais caracteres que o seu número original em cada balão, mas a verdade é que nem sempre o tamanho do balão e o tamanho da fonte necessitam que se poupem os 2 caracteres de “de um” e “de uma”. Quanto à tradução de texto nos cenários, confesso que não gosto de ver numa página uma mistura de português com inglês, para além do texto traduzido nas legendas e balões. Alerta-me sempre os sentidos que algo está errado quando depois de se passar pela Feed & Supply e se chegar à Book Emporium se encontre um letreiro a dizer “fechado” em vez de “closed”. A regra frequentemente utilizada por alguns tradutores e legendadores é somente traduzir o que é imprescindível para a estória. E, portanto, o leitor tem de compreender que quando Tracy chega ao alfarrabista, este se encontra fechado. No entanto, trata-se de algo tão simples e cuja fonte em nada respeita a fonte original que, no meu caso, causa ruído à leitura. Pessoalmente, preferia não o ver traduzido, apesar de compreender as razões porque foi (se bem que a expressão verbal e postural de Tracy que se segue tornam completamente inteligível o sinal da porta), tal como não traduziram o néon de “open” para “aberto” quando Tracy e Gabby foram comprar gelados. Imprescindível é realmente a tradução do bilhete de Gabby para Tracy, devidamente realizada, apesar de na versão portuguesa faltar Eel Valley na sua morada, o nome da localidade onde a maioria da ação desta BD ocorre, uma informação que, inclusivamente, já nos tinha sido dada na pg. 64.
Fim de semana mau

Se alguma temática unifica Criminal: Livro Quatro da G. Floy é a homenagem à própria banda desenhada. Se isso foi evidente com as 2 BD anteriores, também o será com Um Fim-de-Semana Mau, apesar de ser realizada em moldes completamente distintos. Se naquelas existia um olhar nostálgico, agora é a vez do dourado se tornar negro.
Esclareça-se que Um Fim-de-Semana Mau não é a BD de Criminal que se segue ao one-shot Criminal 10th Anniversary Special. Como já abordámos, a esse one-shot seguiu-se-lhe o livro em capa dura Os Meus Heróis Foram Sempre Drogados em 10 de outubro de 2018. Enquanto escrevia essa banda desenhada, Brubaker apercebeu-se que não queria esperar tanto tempo para contar mais estórias de Criminal e, com Phillips, decidiu trazer a série novamente ao formato mensal, desta vez na Image. A série de 12 revistas foi publicada entre 9 de janeiro de 2019 a 19 de janeiro de 2020, onde contaram algumas estórias curtas, bem como uma longa que constitui Cruel Summer (passada no verão de 1988 com Teeg, Ricky e Leo, foi compilada em livro em 12 de agosto de 2020, incluindo não só os #5-12 da série, como também o #1, o qual foi idealizado como uma estória única mas se tornou um prólogo da estória longa supracitada; essa antologia constituirá o próximo livro de Criminal da G. Floy).
Então, e que sucedeu aos #2-4? Os #2-3, uma estória única, viriam a constituir Um Fim-de-Semana Mau. Na verdade, os autores, aquando de compilá-los em livro, não limitados ao número de páginas fixas dos comics, optaram por expandir a estória com novas cenas, contendo a antologia, deste modo, material inédito na própria banda desenhada. É esta versão aumentada – e não somente os comics #2-3 – que está compilada em Criminal: Livro Quatro.
Um Fim-de-Semana Mau, passado em 1997, está repleto de pequenas referências a histórias verdadeiras da indústria de comics (incluindo situações específicas como o acidente fatal de Alex Raymond, com 46 anos, enquanto conduzia o Corvette de Stan Drake, ou questões genéricas como os criadores e autores de BD dos populares super-heróis da Marvel e DC terem poucas regalias económicas sobre o seu trabalho, tendo sido as editoras quem lucrou com as suas criações). Brubaker frequentou a San Diego Comicon quase todos os anos desde 1976 até aos finais dos anos 90, altura em que a começou a frequentar mais espaçadamente. No entanto, nos primeiros tempos, tal como para Jacob Kurtz, o criador da tira “Frank Kafka, Detetive Privado” (cf. Livro Um e Livro Dois), a Comicon era algo central na vida de Brubaker e sempre quis escrever uma história passada num lugar similar. Aliás, não foi por acaso que, nos EUA, Bad Weekend foi lançado na Comicon, tendo como exclusivo uma sobrecapa dedicada a Danny Dagger and the Fantasticals, a série de animação fictícia cujos storyboards foram desenhados pela personagem Hal Crane. A título de curiosidade, apresenta-se essa sobrecapa:

Contudo, não se suponha que a Comicon presente nestas páginas tem um propósito de celebração do evento, dada a quantidades de pormenores negros que habitam na mesma. Não é por acaso que no título consta a palavra “mau”, mais explícita que o título provisório que a BD teve, The Longest Weekend… Segundo Brubaker, o veterano autor de BD Hal Crane é inspirado em quatro ou cinco ilustradores, mas também uma projeção dos seus piores medos sobre o final da sua carreira. A tragédia de Hal é a de que o seu melhor trabalho nunca foi publicado e a sua própria criação foi uma traição ao seu ídolo. Uma traição ao seu ídolo que Jacob também mimetiza.
Para além dos sorrisos que muitas cenas da Comicon irão gerar, os leitores acharão familiares muitas das ilustrações da BD evocada (atente-se por exemplo na imagem de Star King na pg. 120, que tem inclusivamente destaque nas páginas iniciais do Livro Quatro) ou pormenores como o logo da editora Bell Comics a se assemelhar ao da Dell.
É também Um Fim-de-Semana Mau que traz de regresso outro personagem conhecido dos leitores, Ricky Lawless, o irmão de Teeg, na qual se explora mais a sua dinâmica com Jacob na idade adulta, algo a que os autores regressarão com Cruel Summer mas noutra faixa etária.
Em suma, Um Fim-de-Semana Mau é uma história agridoce na qual Sean & Phillips, aos poucos, nos começam a trazer de regresso a acontecimentos mais atuais do universo de Criminal, representados pela presença de Ricky nas últimas páginas. E fecha com chave de ouro a trilogia de estórias reunidas neste volume, com momentos que certamente permanecerão por muito tempo na mente dos leitores.
E onde está o desaparecido Criminal (Image) #4?
Os leitores atentos, terão reparado que se referiu que o próximo livro da G. Floy republicará o volume norte-americano Cruel Summer, ou seja, que compilará os #1 e 5-12. Tendo Um Fim-de-Semana Mau sido uma expansão dos #2-3, fica a questão sobre onde se encontra o #4.
Na verdade, a BD “Órfãos” (tradução nossa) constante desse número, não foi compilada nas habituais antologias de Criminal nos EUA. Atualmente, encontra-se somente republicada no volume Criminal: The Deluxe Edition Volume Three (que inclui todas as BD do Livro Quatro da G. Floy e ainda Os Meus Heróis Foram Sempre Drogados e os #1 e 4 da Image). Ou seja, os leitores norte-americanos que desejem ler o #4 da série mensal da Image apenas o podem realizar ou através da leitura da própria revista ou do terceiro volume da edição dita de luxo. É uma forma não só dos autores continuarem com a sua política de valorização das revistas, como também uma chamada de atenção para as edições deluxe.
Atendendo a esta questão e dados os autores não estarem atualmente a produzir nenhuma série de Criminal, o Bandas Desenhadas perguntou à editora Christine Meyer se a G. Floy estava a considerar incluir o #4 no próximo volume português, a edição nacional de Cruel Summer. “O Ed Brubaker não quis que incluíssemos o #4 nem no nosso Livro Quatro nem no Cinco“, esclareceu, “mas que esperássemos por one-shots adicionais que venham a ser publicados nos EUA, que poderíamos então compilar num novo volume – provavelmente, o nosso Livro Seis.“
A boa nova constante destas declarações é que Brubaker planeia regressar à série Criminal, mais cedo ou mais tarde. Que melhor notícia poderia haver?

Fundador e administrador do site, com formação em banda desenhada. Consultor editorial freelance e autor de livros e artigos em diferentes publicações.