
O ano editorial de banda desenhada em Portugal em 2021.
Não é segredo! A humanidade chegou ao final de 2020 ciente de que a pandemia de COVID-19 continuaria presente no quotidiano de 2021. Mais confinamento e desconfinamento, mais regras e menos regras limitantes no retalho.
No que toca à distribuição física de banda desenhada, os pontos de venda de periódicos mantiveram-se sempre abertos em 2021. A mesma sorte não tiveram as livrarias, o principal canal de distribuição de BD.
O Festival Internacional de BD de Beja realizou-se mais tardiamente no ano, com menos exposições e menos autores presentes – mas realizou-se e bem! A Tertúlia BD de Lisboa foi reinstaurada em outubro, 19 meses depois da sua suspensão em 2020. Seguiu-se o Amadora BD. E até a Comic Con Portugal se realizou este ano.
Por outro lado, ao longo do ano, ocorreram alguns eventos mais vocacionados para a edição independente, em especial em dezembro, onde contabilizámos pelo menos quatro (Feira Parangona, 1.º Mercado de Ilustração e BD do Museu Bordalo Pinheiro, M.A.L. – Mercado Aberto do Livro e Ilustríssimo – Mercado de Ilustração). Relembre-se que a distribuição alternativa, isto é, não distribuída em livrarias nem pontos de venda de periódicos, correspondeu em 2019 a mais de um quinto da produção nacional – algo que tem vindo a decrescer nos últimos anos, com um menor número de publicações de edições de autor e fanzines. Se a ausência de eventos de especialidade em 2020 pôde ser apontada como uma das causas para o esmorecimento desta atividade, a verdade é que nos eventos realizados em 2021 não se verificou a elaboração propositada de muitas obras de BD autoeditadas para serem comercializadas nos mesmos.
Não será de estranhar constatar-se que, tal como em 2020, a pandemia continuou a alimentar a criatividade e produção de alguns autores nacionais nas plataformas da internet e/ou livros em 2021, fosse em registos mais humorísticos ou dramáticos relacionados com o omnipresente vírus. E há já alguns anúncios de que existirão mais obras relativas à temática em 2022.
De qualquer modo, 2021 foi o ano em que editores e autoeditores já estavam cientes das regras e possibilidades que cada fase da epidemia no nosso país poderia ditar, podendo elaborar estratégias após as experiências obtidas no ano anterior. Por exemplo, para além dos apoios do estado, se uns continuaram a editar em pleno encerramento das livrarias e exploraram outros canais nesses períodos, outros optaram por não o realizar, ajustando o seu planeamento à disponibilidade de tal canal.
Por outro lado, a pandemia tem trazido também outro tipo de desafios a nível global, que se sentem também no nosso país, como é o caso da crise energética e os problemas nas cadeias de abastecimento. A escassez de papel, por exemplo, realizou uma perturbação direta no setor livreiro.
Em Portugal, iniciamos 2022 com um crescente recorde de número dos casos de infeção e um período com medidas de contenção de contactos. A Tertúlia BD de Lisboa de janeiro foi cancelada. A realização do festival de Angoulême em janeiro foi, pelo segundo ano consecutivo, cancelada. No entanto, apesar de todas as incertezas do que o restante ano trará, as editoras sabem que… Continuar a editar é preciso. Que os leitores não faltem!
Olhemos então para os dados referentes a 2021. Apresentamos hoje o somatório dos dados mensais publicados no nosso site relativos à banda desenhada editada em Portugal no ano passado. Ainda com carácter pré-definitivo, a estatística apresentada refere-se a novidades de banda desenhada, isto é publicações com BD em 50% ou mais das suas páginas. De qualquer modo, no final apresentam-se ainda alguns dados relativos às publicações sobre banda desenhada, editadas em 2021.
Para esta análise não são contempladas reimpressões. Também não fazem parte desta análise as revistas e livros importados em língua francesa e na norma brasileira da língua portuguesa, distribuídos nos pontos de venda de periódicos.
Total:
284 publicações de BD
- janeiro: 15
- fevereiro: 12
- março: 19
- abril: 27
- maio: 21
- junho: 26
- julho: 24
- agosto: 23
- setembro: 31
- outubro: 48
- novembro: 22
- dezembro: 16
Comparativamente, com o número total de publicações de BD em 2020 – ligeiramente acima das 270 -, houve um aumento de 3% relativamente ao ano passado. No entanto, comparado com o ano pré-pandémico de 2019 (ligeiramente acima das 310), verifica-se um decréscimo de 10%.
Subtotais:
- Livros de BD com distribuição no canal livreiro e/ou bancas: 225
- janeiro: 11
- fevereiro: 9
- março: 15
- abril: 22
- maio: 17
- junho: 21
- julho: 16
- agosto: 21
- setembro: 21
- outubro: 40
- novembro: 20
- dezembro: 12
- Revistas de BD com distribuição no canal livreiro e/ou bancas: 0
- janeiro: 0
- fevereiro: 0
- março: 0
- abril: 0
- maio: 0
- junho: 0
- julho: 0
- agosto: 0
- setembro: 0
- outubro: 0
- novembro: 0
- dezembro: 0
- Publicações de BD com distribuição alternativa: 59
- janeiro: 4
- fevereiro: 3
- março: 4
- abril: 5
- maio: 4
- junho: 5
- julho: 8
- agosto: 2
- setembro: 10
- outubro: 8
- novembro: 2
- dezembro: 4
No que toca ao mercado livreiro, o ligeiro pico em abril coincide com o desconfinamento, após 3 meses com poucas publicações. Quanto ao pico de outubro, coincide com a realização do Amadora BD. Dezembro é caracterizado pela diminuição habitual da atividade editorial.
Distribuição:
- Canal livreiro: 213 (alguns dos quais, só foram ainda comercializados por contacto direto com a editora ou distribuídos em bancas ou em eventos)
- Pontos de venda de periódicos, em exclusividade: 12
- Distribuição alternativa a livrarias e bancas, em exclusividade: 59
A maioria das publicações em banda desenhada editadas em 2021 foi distribuída no canal livreiro. Verifica-se um aumento de 2% dos lançamentos neste canal no que se refere ao ano anterior, mas, quando comparado com o pré-pandémico 2019, há uma diminuição de 11%.
Concomitantemente, a distribuição em pontos de venda de periódicos continua a ser um importante canal para algumas editoras, seja na forma de lançamento inicial seja (quase) concomitantemente com o mercado livreiro. Quanto às publicações em exclusividade neste canal, corresponderam a 4% dos lançamentos totais. Se em 2019, o valor era de 0,6%, tinha aumentado o ano passado para 10% devido à distribuição da série Astérix: Coleção Integral, editada pela Salvat. Com o final da série no decorrer de 2021, deu-se então a diminuição desta percentagem.
Em 2020, o número de lançamentos com distribuição alternativa tinha diminuído para cerca de metade, perante a ausência de certames da especialidade. Em 2021, houve um aumento de cerca de 39%, não tendo ainda sido alcançados os números do 2019 pré-pandémico. Neste ano, cerca de 21% das publicações identificadas não teve, então, distribuição para o grande público.
Formato:
- Jornais: 1
- Livros: 249
- Revistas: 0
- Outros (brochuras, etc): 34
Desde a insolvência da Goody, o número de revistas de banda desenhada nas bancas mantém-se residual ou nulo. Ao contrário de 2020, contabiliza-se 1 jornal em 2021 devido a autoedição de Francisco Sousa Lobo.
Os livros correspondem a cerca de 88% das publicações de BD. Dos 249 livros, eis a distribuição por tipo de encadernação:
- Capa dura: 140
- Capa mole: 109
A encadernação em capa dura está presente em cerca de 56% dos livros de banda desenhada. Este predomínio da capa dura nos livros tem-se verificado nos dados dos últimos anos. No entanto, diminuiu 13% quando comparado com o ano anterior.
Cor de impressão:
- Cores: 180
- Preto: 104
A impressão do miolo a cores está presente em 63% das publicações de BD. No entanto, é um número bastante aquém do habitual. Comparativamente com o ano anterior, diminuiu 17%.
País de origem:
- Alemanha: 1
- Argentina: 1
- Bélgica: 22
- Brasil: 9
- Espanha: 2
- EUA: 33
- França: 65
- Itália: 18
- Japão: 36
- Mónaco: 1
- Noruega: 1
- Portugal: 85
- Reino Unido: 4
- Suécia: 1
- Suíça: 5
Em 2021, o país de origem mais representado é Portugal, com 85 edições. Caso se agregue França (62 edições) e Bélgica (22 edições), chega-se às 87 publicações, sendo superado o número de edições de material nacional. O Japão encontra-se em 3.º lugar, com 36 edições, estando os EUA em 4.º lugar, com 33 edições. Das 85 publicações de material nacional, 41 publicações (48%) não tiveram nem terão distribuição para o grande público.
Comparativamente com 2020, Portugal recupera o 1.º lugar (que tinha sido ocupado pelos EUA o ano passado). Ainda se encontra longe das 105 publicações do 2019 pré-pandémico, mas ultrapassou facilmente as 60 publicações do ano passado.
Depois da BD francesa ter crescido para mais do dobro de publicações entre 2019 e 2020, mantém números similares em 2021, evidenciando que continua a existir uma especial aposta na BD franco-belga, cuja tendência se tinha iniciado em 2019.
O gigante norte-americano caiu desmesuradamente em 2021. Se em 2019 se contabilizaram 90 edições, no 2020 pandémico tinham descido para 73 e em 2021 apenas se registam 33 lançamentos, num ano em que a Levoir, Devir e Planeta não publicaram nenhum material norte-americano e a G. Floy não manteve a atividade de outrora.
Editoras originais das publicações de material estrangeiro:
- Adonis: 2
- Albin Michel: 1
- Andrews McMeel: 4
- Anonima Veritas Editrice (AVE): 8
- Les Arènes: 4
- Bamboo: 1
- Boom!: 1
- Bonelli: 8
- Canterbury Classics: 1
- Casterman: 10
- Cia. das Letras: 1
- Coconino: 1
- Columba: 1
- David Revoy: 1
- Dargaud: 17
- Dark Horse: 4
- Darkside: 1
- Delcourt: 1
- Dupuis: 5
- Les Éditions Albert René: 12
- Éditions Blake & Mortimer: 2
- Emmanuel Proust Éditions: 1
- Evening Post: 1
- Futuropolis: 1
- Glénat: 9
- Graphix: 1
- Hachette: 2
- Hill & Wang: 2
- Hobari Shobo: 1
- Hodder & Stoughton: 3
- Les Humanoïdes Associés: 2
- Image: 8
- Joe Books: 1
- Jupati: 1
- King Features Syndicate: 1
- Lizard: 1
- Le Lombard: 4
- Lucky Comics: 3
- Mag Garden: 2
- Marvel: 3
- Matière: 1
- Minuskel: 1
- Nina Paley: 1
- Norma: 1
- Oni: 2
- Ordfront/Galago: 1
- Orphie: 1
- Paquet: 2
- Rocher: 1
- Sarbacane: 1
- Seirinkogeisha: 1
- Shueisha: 32
- Standaard Uitgeverij: 1
- Turner Broadcasting System: 1
- United Media: 3
- Veneta: 1
- Vents d’Ouest: 6
- Verlagshaus Jacoby & Stuart: 1
- Vicente Segrelles: 1
Do material estrangeiro, destaca-se a Shueisha, com direito a 32 edições, bem como a Dargaud com 17 edições e Les Éditions Albert René com 12 edições. Seguem-se a Casterman (com 10 publicações), Glénat (com 9 publicações), a AVE, Bonelli e Image (com 8 publicações cada uma) e a Vents d’Ouest (com 6 publicações).
A título de curiosidade, registe-se que 2021 teve direito a apenas 3 publicações com material original da Marvel, não existindo nenhuma publicação de material da DC Comics.
Quinquénio da edição original:
- 1930 – 1934: 1
- 1950 – 1954: 9
- 1955 – 1959: 2
- 1960 – 1964: 2
- 1965 – 1969: 1
- 1970 – 1974: 7
- 1975 – 1979: 3
- 1980 – 1984: 6
- 1985 – 1989: 2
- 1990 – 1994: 6
- 1995 – 1999: 3
- 2000 – 2004: 7
- 2005 – 2009: 15
- 2010 – 2014: 16
- 2015 – 2019: 78
- 2020 – 2021: 126
As edições originalmente publicadas no biénio 2020-2021 correspondem a 44% das publicações de banda desenhada. Dessas, 105 (cerca de 37% do total) foram originalmente publicadas em 2021.
Originalidade:
- Inéditos mundiais: 90
- Inéditos em Portugal: 152
- Reedições: 42
As reedições correspondem a cerca de 15% das edições de banda desenhada em 2021. Trata-se de uma percentagem próxima da obtida no ano 2019 (16%), após se ter registado um aumento para 21% em 2020.
Publicações por editora:
- Ala dos Livros: 14
- Âncora: 2
- André Caetano (ed. autor): 1
- Arte de Autor: 16½ (18 publicações)
- ASA: 19
- Associação Cultural Fialho de Almeida: 1
- Bedeteca de Beja: 3
- Bertrand: 1
- Bestiário: 1
- Black Ink: 1
- Booksmile: 8
- Casa da Esquina: 1
- Cavalo de Ferro: 2
- Chiado: 1
- Chili Com Carne: 4
- Companhia das Letras: 3
- Cultura: 3
- Devir: 32
- Ditirambos: 1
- Djinn: 2
- Documenta: 3
- Dom Quixote: 1
- Ego: ½ (1 publicação)
- Elsinore: 1
- ERP Portugal: 1
- Escafandro: 1
- Escorpião Azul: 7
- FA: 3
- Fábula: 1
- Farol: 1
- Filipe Felizardo: 1
- Fojo: ½ (1 publicação)
- Francisco Sousa Lobo (ed. autor): 3
- G. Floy: 14
- Gailivro: 1
- O Gorila: ½ (1 publicação)
- Gradiva: 11
- H-alt: 1
- Ideias de Ler: 1
- Insónia: 1
- Joana Mosi: 1
- João Caridade (ed. autor): 1
- Kingpin: 1
- Kustom Rats: 1
- Levoir: 9
- Libri Impressi: 5
- Lucas Almeida (ed. autor): 1
- Mãotanha Livros e Discos: 1
- Marcador: 1
- Mariana Pita (ed. autor): 1
- Midori: 2
- MigHell Publishing: 1
- Mudnag: ½ (1 publicação)
- Nuvem de Letras: 3
- Oficina das Letras: 2
- Palpable Press: 1
- Pato Lógico: 2
- Patrícia Costa: 2
- Pim!: 1
- Planeta Satélite: 1
- Planeta Tangerina: 1
- Plátano: 1
- Polvo: 9
- Relógio D’Água: 3
- RKComics: 2
- Saída de Emergência: 1
- Salvat: 11
- A Seita: 20 (22 publicações)
- Sendai: 2
- Serafim & Malacuéco, Inc.: 12
- Standaard Uitgeverij: 1
- Suma de Letras: 2
- Tágide: 2
- Tiago da Silva: 1
- Turbina: ½ (1 publicação)
- Umbra: 2
- Xavier Almeida/Arthur Larrue (ed. autor): 2
- Xerefé: 1
Verifica-se então que, em 2021, a Devir é a líder do segmento no mercado, com um total de 32 publicações. Segue-se A Seita com 20 edições (22 publicações, quatro das quais em coedição). O terceiro lugar é ocupado pela ASA com 19 edições. Quanto ao quarto lugar, é ocupado pela Arte de Autor com 16½ edições (18 publicações, três das quais em coedição). Em quinto lugar, encontra-se a Ala dos Livros, ex aequo com a G. Floy, ambas com 14 lançamentos.
Comparativamente com as 5 editoras que mais BD editaram em 2019 e 2020, verifica-se a ausência no top 5 de 2021 das editoras Levoir (1.º lugar em 2020 e 2.º lugar em 2019) e Salvat (2.º lugar em 2020).
Na distribuição alternativa à comercial, a Serafim & Malacuéco, Inc. regressou a números próximos dos 14 lançamentos no pré-pandémico 2019 ao chegar às 12 publicações em 2021, ao contrário das 6 verificadas em 2020.
Edições sobre BD:
- Câmaras Municipais: 0
- Edições de autor: 0
- Editoras especializadas em BD: 1
- Editoras generalistas: 2
- Organizações especializadas em BD: 14
- Instituições de direito privado não especializadas em BD: 2
Do total de 19 publicações sobre BD, 2 (11%) tiveram distribuição para o grande público.
São resultados encorajadores, em oposição ao que tinha acontecido em 2020, com uma redução do número total de edições sobre BD (11 edições em 2020 vs. 15 edições em 2019), bem como das disponibilizadas ao grande público (13% em 2019 vs. 0% em 2020).

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