Undertaker 5: Mais sombrio que nunca!

Undertaker 5: Mais sombrio que nunca!

Análise de Undertaker vol. 5 – O Índio Branco

Na incerteza que é o correr da vida, se há algo que nos mantém a sanidade é aquilo de positivo que se repete, aquilo que sabemos que não acontece sempre, mas de tempos a tempos. E, de tempos a tempos, lá nos sentimos especiais, a transbordar de alegria. Pode ser uma data especial, ou o encontro semanal com um amigo; pode ser a nossa refeição favorita, ou terminar mais um projecto no trabalho; podem ser as férias anuais, ou uma noite serena a tomar uma bebida fresca ao luar.

A constância das coisas boas dá-nos alento e ajuda-nos a prosseguir. Comigo são os livros (entre outras coisas)! É, por exemplo, o novo álbum daqueles autores de Banda Desenhada que admiro. Deles espero uma nova história com o herói de eleição e o encanto do traço que me encanta.

Mas, e quando os autores me retiram a constância, a segurança, e “baralham a escrita”? Bem, no caso de Xavier Dorison (argumento) e Ralph Meyer (desenho), isso significa elevar a fasquia, surpreenderem-me e manterem a admiração deste leitor pela sua arte.

E é precisamente isso que acontece com O Índio Branco, a primeira parte do novo díptico da série Undertaker publicado pela Ala dos Livros.

Se no primeiro díptico é estabelecido o tom das aventuras de Jonas Crow, o cangalheiro, e se cristaliza o seu universo (ver artigo O Bom, o Abutre e um Caixão) e no segundo díptico o anti-herói é apanhado pelo seu passado, naquilo que pode ser considerada uma descida aos infernos (ver artigos Undertaker 3: Enquanto Deus Descansa! e Undertaker 4: Quando o vilão define o herói!), neste começo do terceiro díptico, o tom é mais sombrio, o ambiente é mais pesado… e a fasquia é mais alta!

Vamos à história!

Ao lusco-fusco, a diligência acelera à velocidade possível, travada pela carga e pelo manto de neve que cobre toda a paisagem. Dodson, o cocheiro, faz estalar o chicote na vã esperança de que os cavalos mantenham o esforço. Mais atrás, no seu próprio cavalo, Derek incita Dodson a aumentar a velocidade. No seu encalço, segue um grupo de Apaches implacáveis.

Subitamente, do nada, um fio de arame farpado cruza o caminho, mesmo ao nível do pescoço do cocheiro. Salta a cabeça de Dodson… vira-se a diligência… Derek, por piedade, enfia dois tiros na testa do casal de passageiros, mesmo antes de apanhar com uma flecha em cheio no peito e de se suicidar. Um apache, de rosto pintado de caveira, observa-o imperturbável…

Jonas Crow, cangalheiro itinerante e homem procurado por várias mortes cometidas no final da Guerra da Secessão, quando ainda respondia pelo nome de Harry Strikland, erra de lugarejo em lugarejo oferecendo os seus serviços. Como único companheiro de viagem tem Jed, um abutre que lhe serve de confidente.

Contratado pela Barclay, a companhia de diligências, cabe-lhe agora enterrar as cinco almas que se atreveram a atravessar o território dos Apaches de Salvage. E não se pense que é fácil cavar cinco sepulturas numa terra gelada e pedregosa.

O que Jonas ainda não sabe é que entre os Apaches se encontrava aquele a que chamam o Índio Branco, outrora de nome Caleb, raptado pelos índios que fizeram dele um dos seus melhores guerreiros – uma maneira de punir a sua mãe, Josephine Barclay, proprietária das diligências com o mesmo nome e que quis que o caminho-de-ferro passasse por terras apache. Chegando-lhe aos ouvidos que o seu filho tinha sido morto durante o ataque à diligência, a Sra. Barclay deseja recuperar o seu corpo e dar-lhe um funeral digno. A perigosa missão ficará a cargo de Jonas, acompanhado por um bando de “desperados” encabeçados pelo noivo da mãe chorosa que, por coincidência, é um antigo companheiro de Crow…

A série Undertaker é chegada em Portugal ao seu quinto volume e terceiro díptico. No álbum anterior, A Sombra de Hipócrates, Jonas Crow é reenviado para a sua errância e solidão na sequência da partida de Lin e de Rose Prairie.

Agora, a narrativa de Xavier Dorison apresenta-se, logo de início, dura, rugosa e sem concessões. O leitor rapidamente percebe que está perante uma aventura que, de todas as direcções, o vai bombardear com a aspereza e violência do Velho Oeste. Mais uma vez, o negro que cobre metade da imagem de página dupla com que se inicia o álbum dá o mote ao qual se acrescenta o manto invernal e glacial que cobre a outra metade e que irá persistir ao longo de todo o álbum.

Mas o tom negro que Dorison dá a esta nova narrativa não se limita ao saltar de cabeças. Desde logo, o leitor apercebe-se que Jonas Crow está a passar por uma fase difícil (talvez por ter perdido Rose Prarie) que resolve afogar em bebida. O anti-herói parece assim mais vulnerável e menos senhor do seu destino.

O negrume da narrativa não se limita, porém, à paisagem (ainda que alva) e ao cangalheiro. Homens torturados pelos índios das maneiras mais horrendas, cadáveres a serem alvejados, cemitérios índios pilhados, heróis enterrados vivos, veados degolados e um trilho de corpos nunca visto vão marcando o tom da história, a pretexto da missão de repatriamento do cadáver de Caleb Barclay, o Índio Branco.

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