Entrevista 1 to 1 a Miguelanxo Prado

Entrevista 1 to 1 a Miguelanxo Prado

Entrevista 1 to 1 a Miguelanxo Prado

Entrevista 1 to 1 a Miguelanxo Prado na Comic Con Portugal 2024.

Esta é a terceira entrevista 1 to 1 que o Bandas Desenhadas fez na Comic Con Portugal 2024.  Agora é a vez de Miguelanxo Prado, após Juan Díaz Canales e Daniel Henriques.

Relembro que este conjunto de entrevistas foi nomeado pela organização de 1 to 1. São entrevistas mais intimistas, feitas num espaço reservado, longe do bulício constante da Comic Con, com o apoio de uma equipa técnica fantástica que se torna invisível na hora H. Estes 1 to 1 ou cara a cara ocorreram todos no dia 23 de Março (no que ao Bandas Desenhadas diz respeito), com uma duração de cerca de 10 minutos. Como se disse, esta última entrevista deu-me a oportunidade de estar com o excelente conversador que é Miguelanxo Prado. Eis a entrevista 1 to 1 a Miguelanxo Prado na Comic Con Portugal 2024:

Francisco Pedro Lyon de Castro: O seu trabalho é sobejamente conhecido pelos portugueses há muitos anos. E nós sabemos tudo ou quase tudo sobre si [Prado sorri, divertido]. Por isso, numa entrevista rápida como é a presente, justifica-se fazer-lhe apenas três perguntas. Uma sobre o passado e o presente e duas sobre o futuro. Vamos à primeira! Como explica o seu sucesso em Portugal? Será porque a alma galega é muito semelhante à alma portuguesa?
Miguelanxo Prado: [risada] Não sei… talvez! O sucesso é algo difícil de explicar. Por vezes, não estamos à espera dele. Outras vezes, há que o esperamos e ele foge-nos. Podemos pensar que está apenas relacionado com o trabalho do autor, mas mesmo aqueles que estão habituados ao sucesso têm obras que não foram um êxito. Podemos pensar que se deve ao trabalho da editora, mas, como é o meu caso em Portugal, fui mudando de editora ao longo dos tempos, e as minhas obras continuaram a ser bem acolhidas. Estive na Mériberica, na Asa, Vitamina BD, na Levoir e agora na Ala dos Livros. E aqui, a coesão, o mais forte denominador comum, é a Maria José [Pereira] que, como editora, sempre me acarinhou e apostou em mim. Mas, também isto, por si só, não justifica o meu sucesso em Portugal. Por isso, talvez tenha razão; talvez seja porque a alma galega seja semelhante à portuguesa. Galegos e portugueses são povos muito envolvidos pela nostalgia, pela saudade, por uma certa maneira de sentir e de levar a vida. E isso transparece nos meus livros. Não sei…. Talvez seja isso… Não sei!

FPLC: Qual é o seu próximo trabalho? O segundo volume da Trilogia do Tríscelo está para breve?
MP: Aqui, a resposta também não é simples! [sorriso] Sou uma pessoa organizada que gosta de controlar as edições dos seus livros e acompanhar os lançamentos. Para isso, planeio a publicação de cada novo livro de forma a que as várias edições internacionais sejam todas lançadas no espaço de um mês. Deste modo, concentro a promoção da obra num período contido, implicando isso várias viagens internacionais. E embora tivesse sido esse o meu desejo para o lançamento do segundo volume de Presas Fáceis, por várias razões a situação descontrolou-se e o livro está a ser lançado em vários países desde Janeiro. Ora, isso tira-me tempo para trabalhar. Se estou aqui na Comic Con, não posso estar a escrever ou a desenhar. Contava recomeçar o trabalho no segundo volume “dos Pactos” em Março, mas vai ser impossível, assim como em Abril. Mas é esse que vai ser o próximo livro. Já agora, deixe-me dizer-lhe que não costumo fazer séries, embora às vezes elas surjam, como se tivessem vontade própria ou alheia [risada]. Foi o que aconteceu com O Pacto da Letargia. Inicialmente, era para ser um único volume ou um díptico. Mas os editores começaram a falar em trilogia e surgiu então esta Trilogia do Tríscelo. Na verdade, cada “pacto”, cada história é independente e contida em si própria. Mas acaba por formar um todo, inclusive com alguns personagens a transitar de uma história para outra.

FPLC: Última pergunta. Depois de Amani, vai continuar com a literatura infantil?
MP: [O rosto de Miguelanxo Prado ilumina-se, como se esta fosse a única pergunta verdadeiramente importante] Gostava muito. [E depois com uma expressão quase de resignação que parece traduzir-se num regresso à realidade]. Foi um livro que me deu muito prazer fazer. Um livro que me trouxe felicidade. Posso mesmo dizer que, dos meus livros, este é o meu favorito. Há muito que tinha pensado nesta história e fui aprimorando-a ao longo dos tempos até que surgiu a oportunidade de a publicar. Sempre pensei que os livros infantis pecam por duas coisas. Uma é o facto de não abordarem determinados assuntos mais complexos porque acham que as crianças não têm capacidade de os processar ou não devem ser expostas a eles. Na verdade, as crianças têm capacidades cognitivas que os adultos já esqueceram que tiveram. Dou-lhe o exemplo da morte – é um tema tabu, praticamente ausente da literatura infantil. E, no entanto, as crianças lidam com ela, seja porque morreu-lhes um parente, um gato ou um personagem de qualquer história. Porque não haver um livro que os faça pensar a morte e que os ensine a lidar com ela?

FPLC: Pode ser o seu próximo livro!
MP: Ah, não, não… [responde surpreso pelo desafio lançado] O outro “pecado” dos livros infantis é os estilos artísticos predominantes que também parecem tratar as crianças como incapazes de digerir estilos mais realistas. Ou é tudo muito estilizado, por vezes quase abstracto, ou muito infantil. Ora, em Amani tentei contornar as questões dos temas e da arte. E fiquei muito contente com o resultado final. Agora, dificilmente conseguirei convencer um editor a dar-me tempo para deixar de fazer os meus livros para adultos durante 4 a 5 meses – 1 mês para escrever e 3 ou 4 para desenhar e pintar -, de modo a poder fazer um livro para crianças. Respondendo à sua pergunta, gostava de continuar a fazer livros infantis, mas isso dificilmente acontecerá.

FPLC: Eu também gostava que isso acontecesse! Muito obrigado por esta conversa. Foi um verdadeiro prazer.
MP: Eu é que agradeço.

Pela última vez, seguiu-se a fotografia cara-a-cara que planeei tirar com todos os autores das entrevistas 1 to 1. A última prova de fogo, de longos segundos, olhos nos olhos, alma galega face à alma portuguesa.

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