Contos de Fadas Marvel, com entrevista aos autores portugueses

Contos de Fadas Marvel, com entrevista aos autores portugueses

um15Tudo se iniciou em 2006 com os X-Men e uma minissérie de 4 números de C. B. Cebulski, no qual o argumentista fundia a equipa de mutantes com contos tradicionais dos continentes asiático, africano, europeu e norte-americano. Cada número era independente e desenhado por um artista diferente. O sucesso desta iniciativa originou que em 2007 se lhe seguisse uma minissérie de 4 números intitulada Spider-Man Fairy Tales com premissas similares, sendo um dos números desenhado pelo português Ricardo Tércio, e em 2008 a minissérie de 4 números Avengers Fairy Tales, com 3 números desenhados por autores portugueses – a Ricardo Tércio juntaram-se João Lemos e Nuno Plati.

O volume 15 da coleção Universo Marvel da Levoir distribuído com o Público, é uma espécie de best of das duas últimas minisséries, com 3 números retirados de cada uma delas, não tendo sido publicado o #3 de ambas (nem a minissérie original).

Propõe-se que, previamente à leitura do livro, se leia esta entrevista realizada aos 3 autores portugueses supracitados e a Ricardo Venâncio, onde se encontra explicada a génese do seu envolvimento nas BD reproduzidas neste volume. A entrevista foi realizada há sete anos, no início de 2007, e decidiu-se republicá-la na íntegra, apesar de nem todos os projectos abordados terem sido concretizados:

Quatro autores portugueses têm projectos na área da Banda Desenhada com argumentos de C.B. Cebulski para as editoras norte-americana Marvel e Image. Nuno Pereira de Sousa entrevistou João Lemos, Nuno “Plati” Alves, Ricardo Tércio e Ricardo Venâncio.

NPS: Antes de iniciarmos propriamente a entrevista, gostava que o Nuno Alves nos esclarecesse o porquê de “Plati”.
Nuno Alves: Antes de mais, obrigado pela oportunidade de divulgarmos o nosso trabalho. Quanto à questão, simplesmente, porque me chamavam assim no secundário. Reencontrei alguns amigos dessa altura na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa (FBAUL), os quais me chamavam dessa forma. Basicamente, era assim que era conhecido pela maioria das pessoas que, provavelmente, nem sabiam que me chamava Nuno. O nome não tem nada a ver com o jogador de futebol, mas sim com um blusão manhoso que eu tinha quando era mais puto, o qual tinha o nome Platini escrito, como referência a uma equipa de salvamentos nas montanhas. Pelo menos, é assim que me lembro disto

NPS: Qual a vossa experiência na área da BD em particular e das artes em geral?
Ricardo Tércio: O trajecto do costume…Tertúlia, fanzines, concursos. Depois andei na FBAUL… Era da turma do [Rui] Lacas e do “Plati”. Quando bazei, dediquei-me mais à animação (Da Weasel, Blasted Mechanism, Rodrigo Leão) e, juntamente com o Paulo Prazeres, montámos a produtora de vídeo Droid i.d..
João Lemos: Até agora, a minha quilometragem de páginas de B.D. publicadas ascende a um impressionante valor de meia-dúzia – ou cinco e um double-spread, para os picuinhas. As seis consistem numa narrativa chamada “dance“, feita a partir de um conceito do C.B. Cebulski para a primeira antologia da A.C.T.O.R. – agora HERO -, uma associação que procura identificar e auxiliar veteranos dos comics que, encontrando-se na reforma num país cujas prioridades orçamentais não passam pela segurança social, estão neste momento em francas dificuldades. Embora não esteja perto de explodir de orgulho com o que dei a esse trabalho, dou por mim a pensar que, tendo em conta a natureza da publicação, o meu percurso nos comics começou de um modo bastante simpático. A nível de ilustração, gostaria de mencionar duas colaborações que, para além da enorme honra implícita, contiveram desafios muito próprios: “O Princípio do Caminho” e “ As Mulheres De Yeshua “ de Frederico Mira George e o design, ilustração e caligrafia de “Sátiro“, o mais recente álbum dos Gaiteiros de Lisboa.
Ricardo Venâncio: Basicamente, até há pouco tempo, a minha relação com a BD tem sido de fã, já desde os meus primeiros anos. Desde que o meu Pai se lembrou de me entreter durante umas férias de Verão, comprando uma colecção de livros do Príncipe Valente do Hal Foster. Daí às edições importadas do Brasil foi um pulo e só tem vindo a piorar desde essa altura. Eu tenho tido intenções de fazer BD desde a adolescência, em especial desde que conheci o João – com quem já partilho ideias e projectos há uns bons 14 anos – e outros desenhadores amadores, mas só ultimamente é que as coisas se têm conjugado nesse sentido. Entretanto, fora da BD, trabalhei com o João e o Nuno como storyboarder num estúdio de animação há uns anos atrás e nos últimos anos tenho estado a trabalhar como ilustrador comercial.
NA: Penso que o meu percurso é similar ao de muitos aspirantes a Ilustrador / Animador / Desenhador de BD e outros títulos que tais dentro destes campos. Desde puto que me interesso por BD, seja Europeia, Americana, Japonesa, Animação, Cinema, enfim, o típico de quem se encontra geralmente a responder a este tipo de perguntas. Os “gibis” da Abril, o Blake e Mortimer, o Tarzan do Joe Kubert, o Conan do Miyazaki, os shorts do Chuck Jones, foram as pedras basilares no meu despontar para isto do desenho e coisas afins. Passei a fase em que frequentei o Clube Português de B.D, onde conheci o trabalho de bastante pessoal novo e a aparecer na altura em Portugal, como, o Lacas, o [João] Fazenda, o [Nuno] Saraiva, o [Pedro] Brito, que foram uma boa influência e me deram uma nova perspectiva da B.D em Portugal. Apesar de ter participado numa ou outra exposição e concurso na altura, nunca me afirmei como “autor”. Depois estive uns anos fora, a viver em Moçambique, e em seguida servi a minha pena na FBAUL, onde conheci o Tércio e o Lacas, dois dos meus melhores amigos. Após uns anos em que divaguei pela Faculdade, decidi tentar a minha sorte na Animação e fiz parte, durante um curto período de tempo, dos estúdios Neuroplanet, onde conheci outros dois melhores amigos, o Lemos e Venâncio. De seguida, emigrei para Inglaterra, onde vivi uns anos, e no meio de muita má vida tirei um curso de animação 3D. Quando regressei a Portugal, decidi tentar a minha sorte na Ilustração e fui agenciado pela WHO – Agência de Talentos Criativos, com quem tenho trabalhado desde então no campo da ilustração em Portugal. Utilizando a net, através de blogs e coisas como o Myspace, fui arranjando alguns trabalhos no estrangeiro, também como ilustrador.

NPS: De que forma pode a Internet abrir portas e como tal aconteceu no seu caso?
NA: Hoje em dia, a Internet é uma porta aberta para o mundo inteiro, com tudo de positivo e negativo que isso acarreta. Se pegarmos no positivo, permite-nos ter o mundo a uns clicks de distância, permite-nos, como no Myspace, por exemplo, trocar ideias com pessoas que de outra maneira seriam totalmente inacessíveis. Actualmente, muitos realizadores, argumentistas, produtores, editores, desenhadores, entre outros, têm o seu blog, espaço no Myspace, ou outra coisa do género. No meu caso, foi devido a ter aberto um blog e, algum tempo depois, um espaço no Myspace que me surgiram as oportunidades de trabalhar no mercado americano, tanto em comics como noutras áreas. Foi, é claro, uma mistura de factores; o João abriu as portas iniciais ao estabelecer um a relação com o C.B., que passou a ter uma ideia de que nós (companheiros de estúdio) existíamos, mas como pessoa híper-ocupada que é, não tinha propriamente disponibilidade para estar a dedicar uma grande quantidade de tempo a todos os amigos do João que sabiam fazer uns desenhos. Tendo noção disso, decidi fazer-lhe um convite no Myspace, no qual ele teve oportunidade de ver com atenção o meu trabalho, através de um link para o meu blog, e, para sorte minha, surgiu assim um convite para trabalharmos juntos.

NPS: Os quatro já fizeram parte da constituição do “Estúdio da Bica”, mas tal já não acontece. Falem-nos um pouco do historial do Estúdio e da sua formação actual.
RT: Eu falo pouco…Alguém que responda a esta (risos).
RV: Nós juntámo-nos em Setembro de 2005, mas nunca existiu o conceito do Estúdio da Bica, ou pelo menos nunca demos um nome oficial ao grupo de ilustradores que partilhavam o mesmo espaço. Quanto a isso, tenho que fazer aqui um mea culpa, porque aparentemente tudo nasceu de um post no meu blog, no qual eu arranjei esse nome, um pouco ao acaso, para nos definir, quando saiu a notícia dos nossos projectos nos EUA. Aparentemente, o nome pegou e, de vez em quando, vemos a referência por aí, mas não é algo que o grupo use. Nós fomos convidados a ocupar uma sala do estúdio da companhia de vídeo Droid i.d..
NA: O convite partiu do Tércio a mim, ao Lemos e ao Venâncio para partilharmos uma sala, onde, sendo amigos acima de tudo, poderíamos trabalhar e trocarmos ideias e influências. E assim foi.
JL: Assim, nós ocupámos uma divisão onde foi possível trabalharmos juntos, mesmo que, na maior parte das vezes, sem projectos comuns.
RV: E aí ficámos os quatro até ao Verão de 2006, altura em que, por várias razões, o Nuno e o João decidiram sair.
JL: O Plati e eu passámos a trabalhar em casa, ambos por razões puramente práticas.
NA: A minha saída do estúdio deveu-se simplesmente a eu ter mudado de casa e a ter encargos maiores do que tinha anteriormente. E ter passado a ter um espaço para um estúdio nesta nova casa. Actualmente, o Tércio e o Venâncio continuam a carregar o nosso estandarte!
RV: Mas a relação entre os quatro continua a mesma.
RT: Basicamente, somos quatro amigos que adoram B.D. e tentam viajar até Angoulême sempre que possível.

NPS: Profissionalmente, desempenham outras actividades não ligadas às artes?
NA e RT: Não.
RV: Neste momento não, mas já tive algumas experiências profissionais que só me reforçaram a vontade de fazer o que gosto, mesmo que as dores de cabeça possam ser maiores de vez em quando.
JL: Actualmente, tenho a oportunidade valiosa de estar completamente envolvido em projectos de criação e concepção.

NPS: Como surgiu a oportunidade de trabalhar com C. B. Cebulski?
JL: A versão curta, com um índice de seca que se tenta manter ao mínimo, é que partimos para o Festival de B.D. de Angoulême de 2005.
NA: Eu e o Tércio temos por hábito ir ao Festival de Angoulême quase todos os anos e nesse ano fomos os quatro.
JL: Comentámos, primeiro, o céu limpo e, depois, o horizonte branco. Seguiu-se a pior tempestade de neve das últimas quatro décadas no País Basco, saltou uma peça – das que fazem falta – do motor de um dos carros, ocorreram maus episódios com a guarda local, incluindo o do pardal morto e o do pontapé na matrícula, descobrimos uma tasca que cheirava a fossa ou se calhar era ao contrário, e perdemos um dia de viagem. Depois, foi simples, chegados a Angoulême e às temperaturas palidamente positivas, encontrámos num dos dias o Joe Quesada a passear…
NA: O “big man “ da Marvel.
RV: Descobrimo-lo um pouco por acaso.
JL: E dei-lhe uma das cópias de um portfólio meu, que, na véspera, a minha namorada e duas amigas paginaram, imprimiram e encadernaram. A ideia era gerar a possibilidade de receber um input dele enquanto artista, do género “trabalha mais a linha“ ou “desiste“, mas acabei por ser contactado, meses depois,  pelo Cebulski, a quem o portfólio acabou por ser entregue. Juro que esta história podia ser muito mais longa.
RV: O projecto Shiki com o João nasceu desse acaso, após o Cebulski ter gostado do que viu, e a relação entre o CB e os quatro foi crescendo ao mesmo tempo, resultando nos projectos em que andamos a trabalhar agora.
RT: Internet… Estar em Lisboa é como estar em Nova-Iorque, no ramo do desenho impresso. Conheci o Cebulski através do Lemos e, posteriormente, no myspace, falámos do negócio dos comics, de estilos gráficos e de cerveja… Demo-nos bem, enviei-lhe cenas e passados uns dias estávamos a desenvolver a “Xantara”.
NA: Como já referi, depois do contacto no myspace, e de trocarmos uns e-mails, começamos a delinear um projecto, e esse projecto tornou-se nas Holidaze. Tentando não ser paternalista, e sabendo que apesar de tudo, da internet, e do consequente encurtar das distâncias, Portugal ainda é um cantinho à beira-mar plantado, e como tal, para se conseguir algo tem que haver uma mistura de factores muito grande. A sorte é essencial, mas para se ter sorte tem que se, pelo menos, tentar encontrar um meio de se expor o trabalho, para que daí surja algo. A qualidade do trabalho é sempre relativa, e no caso dos comics ainda mais. Algo que sirva bem o mercado europeu, pode não o fazer a nível do mercado americano, e vice-versa. No meu caso em particular, o meu estilo não me abre exactamente muitas portas, sendo que o que eu acho que caracteriza o estilo dos quatro membros da Bica é exactamente essa diferença. Se pegarmos em alguém talentoso, como o Daniel Maia, por exemplo, que tem um estilo que se adapta perfeitamente ao mercado americano, é de certeza mais fácil para ele chegar a determinados sítios, em termos do mercado americano. Mas o que eu acho, acima de tudo, é que se deve trilhar um caminho, e não mudar o trilho só porque o estilo do momento é o do Brian Hitch ou o do Steve McNiven, em termos da Marvel, por exemplo. Isto pode soar mal, mas acredito que é bastante importante ter uma integridade artística, e acima de tudo acreditar, que se o trabalho for bom, e se procurarmos sempre melhorar, chegamos lá.

NPS: Estavam familiarizados com a obra de Cebulski?
RV: Sinceramente, eu estava meio desligado do que se passava nos bastidores da indústria até há algum tempo atrás e não o conhecia bem. Por isso, este ano tenho andado a retomar contacto com autores, personagens e tudo o mais.
JL: Enquanto argumentista ele tinha, até à data do primeiro contacto, um percurso de algum modo disperso, mas com o qual nunca me houvera cruzado. Contudo, conhecia algum do trabalho dele enquanto editor da Marvel, nomeadamente nos “Runaways”, um dos seus grandes orgulhos.
NA: E, se não me engano, de mais alguns títulos, nomeadamente do Mangaverse da Marvel. Ou seja, não haviam muitas referências em relação ao seu trabalho.
RT: Eu conheci através do João Lemos.

NPS: Das BD de Cebulski, quais são as vossas preferidas?
NA: Acho que este novo projecto do C.B., “Wonderlost” é o mais interessante de tudo o que ele escreveu até agora.
RT: “Wonderlost” e “Spider-Man – Legend of the Spider-Clan: Elemental Evil”.
RV: Eu gostei do trabalho que ele fez nos “X-Men Fairy Tales”, em especial o conceito geral do projecto
JL: Poupando-nos a todos a cortesia oca das falsas modéstias, as bases do guião da “Shiki” são, até mais ver, o meu conceito favorito na sua obra. Estou curioso em relação ao desenrolar do “Xantara”, pela potencial estranheza simpática, e do “Wonderlost”, um trabalho dele com contornos mais próximos dos comics ditos independentes. Nitidamente, o uso de material auto-biográfico criou nele um tipo de vínculo com a obra, que julgo ter estado ausente até agora.

NPS: Se só pudessem pronunciar uma palavra acerca de Cebulski, qual seria?
JL: Quatro.
NA: Porreiro.
RT: Caneca.
RV: Amigo.

NPS: João, fale-nos um pouco de Shiki, a mini-série de 12 nºs, a ser editada pela Image?
JL: É um projecto de fantasia desenvolvido a partir uma ideia base do ubíquo Cebulski, que descreve uma viagem de uma rapariga adolescente por um mundo em que as quatro estações têm manifestações geográficas, e a cujos espíritos essa personagem – Saya – deve um pedido de desculpa. O que me atraiu no conceito, para além das luxuriantes hipóteses visuais, é a possibilidade de enveredar não pelo formato épico, mas sim pelo ponto de vista de uma viajante, cuja idade é, já por si, iniciática.

NPS: A série foi também disputada pela Dark Horse. O que nos pode dizer sobre tal e as razões da decisão pela Image?
JL:A Dark Horse tem no seu percurso uma série de colaborações com alguns dos meus autores favoritos. Tal como o Ricardo Venâncio, eu fui um ávido seguidor da Legend, um corpo de talento que na altura funcionou quase como que uma contra-face dos vários estúdios da Image. Como tal, estive algum tempo na esperança de que a “Shiki” acabasse por ser feita aí, mas questões puramente contratuais acabaram por declarar a Image como a melhor opção. A Image, entretanto, tornou-se uma editora radicalmente diferente do que era no tempo da Legend, tendo agora uma abertura que, apesar de acarretar o perigo da descaracterização, permite uma panóplia de títulos com uma variedade que recorda a própria Dark Horse.

NPS: Quando começa Shiki a ser lançada?
JL: Já aprendi a parar de ir confirmar a data proposta mais recentemente especificada e apresentá-la como um dado adquirido. Vamos fazer tudo ao nosso alcance para começar a publicá-la bem e regularmente este ano.


NPS: Quem realizou o teaser de Shiki colocado no youtube?

JL: O verbo realizar parece-me demasiadamente sério, quase adulto. A culpa é minha e só tive o software que mereço, aquele novelo de limitações que vem no windows. O som – a parte boa – é a faixa sonora do trailer do “The New World” do Terrence Mallick, que usei como pauta para a montagem. Já a culpa do vídeo ter acabado no youtube, onde felizmente ninguém vai, é do Cebulski. O Tó Forte, um ilustre membro da Droid – i.d., tem andado a queimar algum do seu tempo livre com um clip com diversas fases de produção, que arrumará este de vez.

NPS: Quer o João Lemos, quer o Ricardo Tércio estão a trabalhar com o Cebulski com Fairy Tales para a Marvel. Qual a vossa opinião sobre X-Men Fairy Tales?
RT: É sempre interessante ver os super-heróis noutras versões. As escolhas foram originais e inesperadas.
JL: Confirma-se que a diversidade tende para a surpresa e para a inconstância. Estavam lá dois nomes que considero serem fundamentais, o Bill Sienkiewicz e o Kyle Baker.

NPS: João, fale-nos de Avengers Fairy Tales.
JL: Na sequência do sucesso da série X-Men: Fairy Tales, a Marvel convidou o C.B. Cebulski para desenvolver duas novas séries ligadas ao universo do conto de fadas, uma com os Avengers, e outra com o Spider-Man, que terá a particularidade invejável de hospedar o primeiro trabalho de comics do Ricardo Tércio. Embora a série dos X-Men tenha sido marcada por uma apropriação fundamentalmente ligada a contos do espólio antigo e popular de diversas culturas, as novas incluem também contos mais recentes e com autores definidos, tais como o Peter Pan e o Feiticeiro de Oz, ambos publicados no período da viragem do século.

NPS: Sabe-se que Peter Pan corresponderá à figura do Capitão América. Quais são as outras correspondências?
JL: Bem, a mais óbvia das fusões, se não mesmo a mais previsível, é a da fada Tinker Bell, por cá Sininho, com a Wasp. Os Lost Boys vão ser encarnados pelo Iron Man, o Thor, o Black Panther e o Hawkeye. Nada de Hulk, infelizmente. Um Lost Boy, enorme e cheio de musgo seria interessante. Surgiu uma série de personagens associáveis às do Peter Pan, mas ainda não sabemos quantas poderão de facto aparecer, até porque não podemos publicar no formato do Onde Está o Wally.

NPS: E quanto a Spider-Man Fairy Tales, Ricardo?
RT: O Cebulski falou-me da hipótese e eu comecei logo a fazer ilustrações e teasers. Falei-lhe que andava bastante influenciado pela Pixar e que gostaria de ver super-heróis  num prisma mais infantil, e isto vai ao encontro do interesse da Marvel de abranger outro público. O Capuchinho Vermelho acabou por ser a história que mais se adequava ao meu estilo cartoony/ animação.

NPS: Quais são as correspondências, a nível de personagens, entre o Homem-Aranha e o Capuchinho Vermelho?
RT: O capuchinho é a MJ…Vai haver uma besta muita bruta e mais… não posso adiantar! Mas vão visitando o meu blog e o do Cebulski e, brevemente, saberão mais. Já fiz a capa – nos comics é a primeira coisa a ser feita, a seguir aos designs, devido às previews e encomendas – e não deve tardar a aparecer na net.

NPS: Qual é o vosso conto de fadas favorito?
RT: Acho “O Gato das Botas” bastante divertido e carismático. O do “Shrek 2” está muito bem conseguido, embora eu não goste do look geral do filme. Gostaria de ver um grande artista europeu como a [Claire] Wendling ou o [Enrique] Fernandez a fazer uma adaptação.
JL: Eu cresci rodeado de referências folclóricas e mitológicas, mais até do que de BD, e como tal não consigo ter uma favorita. Há, isso sim, um conjunto de contos e lendas específicas que me são muito caras, várias das quais tenciono poder adaptar com o tempo.

NPS: Nuno, fale-nos de Holidaze, a ser editado pela Image..
NA: A ideia é ser algo que não se leve muito a sério, meio filme de acção de Hong Kong, meio Anime/Manga no estilo da acção e do ritmo, com 4 protagonistas que esperemos que sejam carismáticas, não tanto “Charlie´s Angels” ou “Danger Girl” mas mais personagens de um filme do Tarantino ou de série B dos anos 70, embora com uma sensibilidade moderna. Acho que para quem goste destas referências pode ser uma boa fonte de entretenimento por 20 minutos. Só para terminar, deverá ser um one shot de 48 páginas.

NPS: Existe data de lançamento?
NA: Em princípio, falou se de lá para o meio de 2007. Isto, se eu cumprir os deadlines! (risos)

NPS: E costuma cumpri-los?
NA: Em termos de ilustração, sempre. No caso da BD, esperemos que sim, mas é um bicho completamente diferente! (risos)

NPS: Ricardo, o que nos pode contar sobre No Quarter, BD a ser editada pela Image?
RV: “No Quarter” é ficção científica na Lua. Uma base lunar humana é atacada por um inimigo invisível e quatro soldados lideram os companheiros na resistência. Neste momento, é que posso revelar acerca da história.

NPS: E existe data de lançamento?
RV: 2007 é a única certeza que posso dar neste momento.

NPS: Ricardo, fale-nos de Xantara, a ser editada pela Image.
RT: Os projectos creator owned não têm prazos, na maioria dos casos. Logo, ainda não tem data de saída precisa. Estamos a desenvolver com calma. Tem muitos monstros, mundos paralelos, é fofo e dark, passa-se em Amsterdão…e logo se vê.

NPS: Que outros planos têm para 2007 que possam ser revelados?
JL: Criar um blog, para alterar a cor da cara dos meus ex-colegas de estúdio, que do Verão passado a esta parte têm mantido um voto de apneia que durará até eu abrir uma dessas coisas. Outro envolve uma série de serigrafias que serão impressas pelos Clash City Printers, à mão e numa máquina de aço verde, da agora arqueológica Europa de Leste, que parece um robot a hibernar. Continuo a trabalhar em projectos meus, sendo que alguns deles são argumentos para outros mais capazes do que eu. Depois de ter tido o privilégio de colaborar com o Carlos Guerreiro dos Gaiteiros de Lisboa, no já referido “Sátiro“, começámos a trabalhar na concepção de uma série de instrumentos musicais, entre outros engenhos, cujos designs, feitos por mim, serão por ele materializados nas bancadas da sua extraordinária oficina. Existem, por fim, alguns projectos que poderão vir a acontecer em colaboração com a Droid – i.d.
RT: Estou a trabalhar no meu livro infanto-juvenil chunga “o puto que andava em cima de monstros” e espero editá-lo, talvez em edição caseira. E projectos de animação, sempre.
RV: Além de “No Quarter”, tenho um trabalho muito interessante a sair no princípio do ano relacionado com música, mas a partir de Março, sensivelmente, saber-se-á mais sobre isso. A partir daí, é tentar continuar a trabalhar em BD regularmente.

NPS: Esse projecto relacionado com música está também ligado aos EUA?
RV: Não, o projecto é português. Bom, os responsáveis diriam que não são deste planeta, mas moram todos por cá.

NPS: Nuno, e os seus projectos para 2007?
NA: Tenho um mini-projecto com o Ivan Brandon (NYC Mech, The Cross Bronx) para a Image, tenho as “Holidaze” e, a nível nacional, tenho colaborado com a Animanostra e é possível que possa sair algo daí.

NPS: Em que consiste o projecto com o Brandon?
NA: Apenas posso dizer que, se tudo correr bem, é uma história para uma antologia, em que participam alguns dos meus autores de comics preferidos. Como tal, é uma honra ter a oportunidade de ter como companhia esses autores.

BD: E de que forma tem sido a colaboração com a Animanostra e o que poderemos esperar que resulte daí?
NA: A colaboração com a Animanostra tem sido muito boa. Basicamente, fiz character designs para um projecto, que esperamos que consiga luz verde, e estão em cima da mesa outras propostas. Só tenho coisas boas a dizer da nossa colaboração até agora.

NPS: Qual a vossa opinião sobre o actual mercado de BD nacional?
NA: Como tudo em Portugal, é pequeno, mas penso que pelos anos de vida da Bd Mania e da Mongorhead é bastante fiel.
RT: Na Tuga, a B.D. paga pouco e vende pouco, por isso os artistas dedicam-se mais à ilustração para sobreviver. Deviam haver mais bolsas e tal (a cantiga do costume). Mas a produção de livros infantis está a andar bem, parece-me.
JL: É um mercado que sofre de uma série de problemas, que se alimentam uns aos outros. Um país endividado e de poucas leituras – e em que se lê menos do que se compram livros –, um estigma ainda forte em relação a uma série de artes pejorativamente relacionadas com a infância, falta de empenho por parte da maioria das livrarias e a péssima representação das distribuidoras por parte de alguns dos seus vendedores são algumas.
RV: Neste momento, não vejo um mercado nacional. Mercado, na minha opinião, implica produção e a sustentabilidade de quem produz, de quem edita e de quem distribui. Depois, implica uma estrutura que não existe por cá. Em Portugal, faz-se BD um pouco por carolice, ou por realização pessoal, como no resto das Artes, penso eu. Acho que é difícil atrair leitores quando não se tenta chegar a eles.

NPS: E sobre o norte-americano?
NA: Acho que está em recuperação, mas penso que é capaz de ser um pouco cedo para se chegar a alguma conclusão.
JL: Em relação ao mercado do E.U.A., ainda estamos a viver os resultados da implosão que sucedeu à histeria eldoradesca do início dos anos 90. A promessa de um horizonte cheio de editoras vigorosas esfumou-se e a Marvel e a DC, em oposição ao estremecer que alguns lhes tinham então vaticinado, são de novo as duas primeiras. A filosofia que impera, tal como a descreveu Alan Moore, é, neste momento, aquela segundo a qual é melhor vender 50 comics que não vendem do que cinco que o fazem. Contudo, em meio a este contexto, estão a florescer algumas novas espécies que, embora possam não ser pesos-pesados de vendas – aos olhos de há 15 anos, quem é? –, trazem uma tamanha individualidade e entrega dos seus autores, que me é impossível não ter esperança num futuro melhor para o meio. O “Rocketo” do Frank Espinoza e o “Weasel” do Dave Cooper são bons exemplos.
RT: Nos EUA, é agradável ver um crescimento dos produtos alternativos e de Autor e também ver estilos gráficos mais cartoony a ter lugar no mainstream. É interessante também ver o caso da Panini, que está a co-produzir originalmente na Europa álbuns em formato franco-belga de propriedades das majors americanas, exemplos de Buchet/Morvan/Wolverine e Jim Lee/Claire Wendling/Batman (este vai partir tudo!!)

NPS: Resta-me agradecer a disponibilidade demonstrada em concederem-nos esta entrevista.

Regressemos de novo ao presente. Para os que não adquiriram os comic books na altura e optaram pela sua compilação em TPB, este volume é particularmente interessante, uma vez que a última série, dedicada aos Avengers, foi compilada somente num formato reduzido (digest) e papel de pior qualidade, formato com que a Marvel pretendia concorrer com o manga e neomanga nos EUA. Neste volume, têm a oportunidade de ler 3 dos 4 números num formato e papel superiores.

Na edição portuguesa, existem ainda alguns textos e imagens sobre o processo criativo de João Lemos e Nuno Plati.

Clique nas imagens da edição nacional:

Eis a sinopse da editora:
Era uma vez… os contos de fadas e infantis tradicionais, como o Capuchinho Vermelho, Peter Pan, Pinóquio, Cinderela, ou o Feiticeiro de Oz, mas desta vez protagonizados pelos principais heróis da Marvel! O Capitão América como Peter Pan, a Vespa como Sininho e os Vingadores como os Rapazes Perdidos, o andróide Visão como Pinóquio ou Magneto como o Feiticeiro de Oz são algumas das surpresas que este volume nos reserva. C. B. Cebulski, editor-chefe e grande caçador de talentos da Marvel, imaginou e escreveu estes contos de fadas Marvel, ilustrados por grandes talentos como Niko Henrichon e Mike Allred, a que se juntam os portugueses João Lemos, Nuno Plati e Ricardo Tércio, que têm nesta série os seus primeiros trabalhos para a Casa das Ideias.

nota: as imagens foram gentilmente cedidas pela editora.

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